(Artigo condensado)
Aos 50 anos, revolução de Castro está perto do fim
Aos 50 anos, revolução de Castro está perto do fim
Domingo, 14 de dezembro de 2008, 10h21
Em meu primeiro dia em Havana, caminhei pelo Malecón, o calçadão urbano de frente para o mar mais pungente do mundo. Um homem gritava, espantando os mendigos que dormiam sobre a represa de pedra construída em 1901 durante o curto domínio americano.Estava praticamente sozinho em uma manhã de domingo na capital cubana de 2,2 milhões de habitantes. Alguns carros passavam a cada minuto, geralmente belezuras rabos-de-peixe dos anos 1950, Studebakers e Chevrolets, extravagantes e envelhecidos. Olhando para o mar, procurava em vão por algum barco.
Quando perguntei sobre o fato a Yoani Sanchez, blogueira dissidente (www.desdecuba.com/generaciony), ela disse: "vivemos de costas para o mar porque ele não nos conecta, mas nos confina. Não há movimento nele. As pessoas não têm permissão para comprar barcos porque se tivessem, elas iriam para a Flórida. Fomos deixados, como um de nossos poetas diz, com a circunstância infeliz da água a cada curva.
A rua Lealtad vai do Malecón até o distrito de Centro Habana, densamente povoado. Parei em uma loja de peixes, ovos e frangos que nada tinha para vender. Antonio Rodriguez, 50 anos, um cortês afro-cubano calvo que administra a loja, me explicou a mecânica da racionalização.Todos os meses, cada cubano tem direito a 10 ovos (os primeiros cinco custam 0,15 pesos cada, o restante 0,90 pesos); 450 gramas de frango custam 0,70 pesos; 450 gramas de peixe com a cabeça custam 0,35 pesos (ou 310 gramas sem a cabeça); e 225 gramas de carne moída de segunda custam 0,35 pesos. Com o dólar valendo 25 pesos, você consegue comprar o pacote todo por menos de 25 centavos de dólar.
Pode parecer uma barganha, mas há alguns poréns. O salário médio mensal em Cuba é cerca de US$ 20. Perguntei a Rodriguez quando os frangos e ovos chegariam. Não faço idéia, ele disse.
Isso foi demais para Javier Aguirre, um homem franzino que ajuda Rodriguez na loja. "Estamos arruinados e após três furacões, ficamos ainda pior," ele disse. "Eu simplesmente não acredito no sistema. Quero a Suíça! De todos os cubanos que foram para os Estados Unidos, quantos querem voltar?" A pergunta gerou silêncio. Aguirre, era evidente, tentou escapar duas vezes, mas foi pego uma vez pelos cubanos e outra pela guarda costeira dos Estados Unidos. Sob a atual lei americana, a maioria dos cubamos que chegam a solo americano obtêm permissão para ficar, enquanto aqueles interceptados no mar são repatriados.
Mas a economia centralizada de Cuba é um desastre. Cuba tem duas moedas, uma para o comunismo e outra para um capitalismo limitado e controlado pelo Estado. Os pesos que as pessoas recebem como salário não dão para quase nada além de itens racionalizados e que ninguém deseja. Já os pesos conversíveis, com paridade cambial em relação ao dólar, conhecidos como "CUCs," podem ser usados para a compra de produtos internacionais.
Em lojas que aceitam apenas peso comum, você leva um pneu de bicicleta, um sutiã amarelado e um jogo de colheres de plástico. Nas de peso conversível, você pode comprar celulares, uísque Jameson e Heineken em um ambiente com ar-condicionado. Como resultado, muitos cubanos passam suas vidas tentando entrar na economia do peso conversível, algo que depende amplamente do contato com visitantes estrangeiros.
Alvarez citou alguns números. Havia seis mil médicos em Cuba na época da revolução; existem hoje quase 80 mil para uma população de 11,3 milhões, um dos índices per-capita mais altos do mundo. O embargo dos EUA custou a Cuba cerca de US$ 200 bilhões em termos reais. Apesar da escassez, atribuída em grande parte ao embargo, essa é uma sociedade que deseja proteger todos. O sistema de racionamento garante que cada cidadão receba o mínimo. Todos ganham refeições de baixo custo no trabalho. Dizer que saúde e educação gratuitas significam um salário de US$ 20 é uma forma equivocada de ver a qualidade de vida cubana.
Os dissidentes de Cuba são marginalizados. A imprensa é silenciada. A versão impressa do regime, Granma, é um estudo em dialeto orwelliano. A televisão estatal é uma máquina inchada de propaganda política. "Existe uma repressão muito inteligente aqui, a repressão científica," disse Yoani Sanchez, a dissidente cujo blog é hoje traduzido em 12 línguas. "Eles nos mataram como cidadãos, para não precisar nos matar fisicamente. Nossa própria polícia está em nossos cérebros, nos censurando antes de pronunciarmos uma idéia crítica."
Aos 33 anos, Sanchez representa algo novo: uma dissidente digital. As autoridades parecem não saber ao certo como lidar com isso. Sanchez, uma mulher franzina e vivaz, começou seu blog em 2006. Agora suas dissecações perspicazes das angústias da vida cubana são acompanhadas amplamente em âmbito internacional tanto que "os serviços de inteligência sabem que, se tocarem em mim, haverá uma explosão online."
Mesmo assim, eles a perturbam. Quando ganhou o prestigioso prêmio espanhol Ortega y Gasset por jornalismo digital em abril, ela foi impedida de ir à cerimônia de entrega.
Quando voltei à rua Lealtad, me deparei com uma agitação: o frango havia chegado! Rodriguez estava descarregando as pernas e coxas de frango. Peitos de frango estavam disponíveis apenas para o mercado do peso conversível. Ele segurava a caixa com um sorriso amplo. Ela dizia, "Made in U.S.A."
Tradução: Amy Traduções
The New York Times
Quando perguntei sobre o fato a Yoani Sanchez, blogueira dissidente (www.desdecuba.com/generaciony), ela disse: "vivemos de costas para o mar porque ele não nos conecta, mas nos confina. Não há movimento nele. As pessoas não têm permissão para comprar barcos porque se tivessem, elas iriam para a Flórida. Fomos deixados, como um de nossos poetas diz, com a circunstância infeliz da água a cada curva.
A rua Lealtad vai do Malecón até o distrito de Centro Habana, densamente povoado. Parei em uma loja de peixes, ovos e frangos que nada tinha para vender. Antonio Rodriguez, 50 anos, um cortês afro-cubano calvo que administra a loja, me explicou a mecânica da racionalização.Todos os meses, cada cubano tem direito a 10 ovos (os primeiros cinco custam 0,15 pesos cada, o restante 0,90 pesos); 450 gramas de frango custam 0,70 pesos; 450 gramas de peixe com a cabeça custam 0,35 pesos (ou 310 gramas sem a cabeça); e 225 gramas de carne moída de segunda custam 0,35 pesos. Com o dólar valendo 25 pesos, você consegue comprar o pacote todo por menos de 25 centavos de dólar.
Pode parecer uma barganha, mas há alguns poréns. O salário médio mensal em Cuba é cerca de US$ 20. Perguntei a Rodriguez quando os frangos e ovos chegariam. Não faço idéia, ele disse.
Isso foi demais para Javier Aguirre, um homem franzino que ajuda Rodriguez na loja. "Estamos arruinados e após três furacões, ficamos ainda pior," ele disse. "Eu simplesmente não acredito no sistema. Quero a Suíça! De todos os cubanos que foram para os Estados Unidos, quantos querem voltar?" A pergunta gerou silêncio. Aguirre, era evidente, tentou escapar duas vezes, mas foi pego uma vez pelos cubanos e outra pela guarda costeira dos Estados Unidos. Sob a atual lei americana, a maioria dos cubamos que chegam a solo americano obtêm permissão para ficar, enquanto aqueles interceptados no mar são repatriados.
Mas a economia centralizada de Cuba é um desastre. Cuba tem duas moedas, uma para o comunismo e outra para um capitalismo limitado e controlado pelo Estado. Os pesos que as pessoas recebem como salário não dão para quase nada além de itens racionalizados e que ninguém deseja. Já os pesos conversíveis, com paridade cambial em relação ao dólar, conhecidos como "CUCs," podem ser usados para a compra de produtos internacionais.
Em lojas que aceitam apenas peso comum, você leva um pneu de bicicleta, um sutiã amarelado e um jogo de colheres de plástico. Nas de peso conversível, você pode comprar celulares, uísque Jameson e Heineken em um ambiente com ar-condicionado. Como resultado, muitos cubanos passam suas vidas tentando entrar na economia do peso conversível, algo que depende amplamente do contato com visitantes estrangeiros.
Alvarez citou alguns números. Havia seis mil médicos em Cuba na época da revolução; existem hoje quase 80 mil para uma população de 11,3 milhões, um dos índices per-capita mais altos do mundo. O embargo dos EUA custou a Cuba cerca de US$ 200 bilhões em termos reais. Apesar da escassez, atribuída em grande parte ao embargo, essa é uma sociedade que deseja proteger todos. O sistema de racionamento garante que cada cidadão receba o mínimo. Todos ganham refeições de baixo custo no trabalho. Dizer que saúde e educação gratuitas significam um salário de US$ 20 é uma forma equivocada de ver a qualidade de vida cubana.
Os dissidentes de Cuba são marginalizados. A imprensa é silenciada. A versão impressa do regime, Granma, é um estudo em dialeto orwelliano. A televisão estatal é uma máquina inchada de propaganda política. "Existe uma repressão muito inteligente aqui, a repressão científica," disse Yoani Sanchez, a dissidente cujo blog é hoje traduzido em 12 línguas. "Eles nos mataram como cidadãos, para não precisar nos matar fisicamente. Nossa própria polícia está em nossos cérebros, nos censurando antes de pronunciarmos uma idéia crítica."
Aos 33 anos, Sanchez representa algo novo: uma dissidente digital. As autoridades parecem não saber ao certo como lidar com isso. Sanchez, uma mulher franzina e vivaz, começou seu blog em 2006. Agora suas dissecações perspicazes das angústias da vida cubana são acompanhadas amplamente em âmbito internacional tanto que "os serviços de inteligência sabem que, se tocarem em mim, haverá uma explosão online."
Mesmo assim, eles a perturbam. Quando ganhou o prestigioso prêmio espanhol Ortega y Gasset por jornalismo digital em abril, ela foi impedida de ir à cerimônia de entrega.
Quando voltei à rua Lealtad, me deparei com uma agitação: o frango havia chegado! Rodriguez estava descarregando as pernas e coxas de frango. Peitos de frango estavam disponíveis apenas para o mercado do peso conversível. Ele segurava a caixa com um sorriso amplo. Ela dizia, "Made in U.S.A."
Tradução: Amy Traduções
The New York Times
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