Bem ali detrás há poucos instantes de meros segundos, essenciais, no entanto, fora tomado daquela mesma sensação esquisita que agora volta a se repetir, a querer, todo custo, se projetar, sair pela ponta dos dedos, na emoção frívola de palavras vivas, indo diretas desde a corrente sanguínea ao papel, esguicho contínuo de uma sensação solitária, a formar definições e falas, bichos vivos, fugitivos. Na mão, fechado, quente, o pulsar heróico do coração do bicho feito pequeno pássaro animado, impaciente, aqui prisioneiro, no meio dos dedos e da palma, à pressão relativa sobre o celular que o retém preenchendo esse âmbito dos sentidos, já dominando a força aquecida no bloco inteiro das percepções vitais da pessoa instalada no comando central dos acontecimentos.
Nisso, a energia sincopa em toda casa. Dá um, dois picos intermitentes, saltos de dentro da madrugada para o dia surgindo nas luzes do nascente, que sorrateiras penetravam pelos quadrados de vidro laterais da porta, como quem quer rever os escuros da noite na sombra que começava, lentamente, a despertar para as novas claridades. Foram eles, os dois pulos de intensidade na energia, e todos receberam o jato de paralisação das funções, sinais suspensos na sobrevivência do ser gente e máquina em que humanos se transformaram.
Aquele espectro sideral de moléculas atadas à condição material na força das circunstâncias obtusas do firmamento, presas no alto do espaço, apenas estagnara em forma de protagonistas vazios da ausência de movimento aparente. Por dentro, no entanto, espasmo cataléptico misturava o sabor do tremer do telefone preso na mão, pássaro contido nas dobras das falanges ao longo do corpo da máquina comprimida.
Imagem paralisada no alvorecer que cessara de vez no cessar da energia da rede silenciada, a virar borrão afixado na inércia que deslizava durante o rio das coisas, sem conter mais no bojo de si o elemento estarrecido em pleno voo, nesse abismo que divide escuro e de iluminação. Parado ficara, permanecera, cartaz preso às margens da longa estrada do tempo.
Lá adiante nas horas, contudo, ainda que avisado durante algumas chamadas perdidas, pelo mecanismo estreitado nos dedos e na palma, acordaria atônito, aos sopapos secos da geladeira refeita no retorno da corrente aos músculos. Isso horas depois, Sol alto no céu, antes do pino do meio-dia, fora das cogitações possíveis e quase vítima do desespero, ouvindo o estalo das coisas descongelando abafadas no interior da fria composição.
Esfregava os olhos quando adquiriu a oportunidade para ativar, outra vez, os mecanismos do domingo junto aos sistemas externos, porém fundamentais à existência dos humanos, dependentes vorazes da corrente elétrica. Agradecido, contudo, estendeu a mão e depôs sobre a mesa o pássaro impaciente, a única via de contato real quando perdera os impulsos do mundo, naquela crise de abstinência temporária dos multimeios.
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domingo, 15 de maio de 2011
Uns animais eletrônicos - Emerson Monteiro
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