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quarta-feira, 26 de outubro de 2011

AUTORITARISMO NA CÂMARA DO CRATO

Desde muito tempo ouço dizerem que uma casa legislativa, não importa se de âmbito federal, estadual ou municipal, é, por definição e atribuições, um lugar do povo, posto que abriga parlamentares eleitos para o mister da tradução dos anseios e inquietações populares. Mas não foi bem assim que me pareceu funcionar a Câmara Municipal do Crato, pelo menos na manhã de ontem, 25 de outubro do ano em que professores da rede estadual foram espancados na Assembleia Legislativa do Ceará.

Pois bem, senhoras e senhores... Saibam, pelas breves e sinceras letras que seguem, sobre a violência e o constrangimento de que fui vítima.

Convidaram-me a assistir a uma sessão na Câmara de Vereadores, durante a qual a bailarina e coreógrafa Danielle Esmeraldo, Secretária Municipal de Cultura, fez uma exposição das ações e projetos de sua pasta, evidenciando o que se denominou de “revitalização” do Centro Cultural do Araripe. Ouvi, atenta e pacientemente, também a intervenção de vários respeitáveis edis da situação e da oposição. Após esse frutífero rito, foi, pelo Excelentíssimo Senhor Presidente da Câmara Vereador Florisval Sobreira Coriolano, oferecida a palavra a quem, do público presente, dela desejasse fazer uso. Aceitei a gentileza e, pasmem, nem bem principiei minhas colocações, o amigo vereador Fernando Brasil, sem solicitar aparte, interrompeu-me insistentemente “mandando” ironicamente que eu mencionasse nomes e mais nomes de prefeitos em minha recém-iniciada avaliação de recentes gestões no quesito cultura. Mesmo do tempo em que eu era apenas uma criança ou adolescente. Absurdo! Como a interferência já impedia que eu desenvolvesse meu raciocínio e beirava o sarcasmo, respondi-lhe com graça que me encaminhasse um requerimento para tal fim. Tentei continuar e fui grosseiramente interrompido pelo Presidente Coriolano acusando-me de desrespeito. Devolvi-lhe no mesmo tom que o povo é que estava sendo desrespeitado, pois no uso da palavra nada nem ninguém me obrigariam a guiar meu discurso pelo pensamento ou desejo de outrem. Ele não aceitou a verdade, perdeu o controle, usou seu poder e encerrou abruptamente a sessão num toque nervoso de campainha para depois sair às carreiras sem sequer agradecer a presença da autoridade convidada ou dos demais cidadãos e cidadãs, aos quais restaram apenas a indignação e a perplexidade diante de desnecessária e reprovável cena de autoritarismo.     

Entendo as motivações políticas que moveram cada gesto e lastrearam cada palavra a mim dirigida. Entretanto, não guardo nenhum rancor e declaro inabalada minha amizade com os nobres parlamentares aqui mencionados. Prefiro, em meu voluntário devaneio, acreditar que todos querem o desenvolvimento do Crato e o bem-estar de seu povo, apesar de achar estranhas algumas atitudes. 

Para finalizar, sinto-me na obrigação de atender aos pedidos de muitos da plateia desejosos de saber o que traria a palavra que me fora ceifada. Nada de extraordinário, julgo, mas a expressão do que percebi de mais significativo nas gestões que presenciei nos últimos cerca de 25 anos como artista, trabalhador e cidadão:

WALTER PEIXOTO – Autor da irreparável tragédia de destruição de quase todo o patrimônio arquitetônico e histórico do Crato em sua primeira gestão.

JOSÉ ALDEGUNDES MUNIZ GOMES DE MATTOS (ZÉ ADEGA) – Deu grande apoio ao movimento carnavalesco, inclusive doando terreno para as escolas de samba construírem suas sedes. Durante sua gestão foi criado o CHAMA – Chapada Musical do Araripe, importante festival de música que fortaleceu a criação local.

ANTONIO PRIMO DE BRITO – Criou a Fundação Cultural J. de Figueiredo Filho, atendendo a reivindicações de artistas e intelectuais. Apoiou grupos folclóricos e também realizou o CHAMA, dando-lhe dimensão nacional. Adquiriu o Cine-Moderno e elaborou projeto inicial de sua transformação no Cine-Teatro Municipal Salviano Arraes Saraiva.

RAIMUNDO BEZERRA – Criou a Secretaria Municipal de Cultura, dotando-lhe de papel estratégico no desenvolvimento do Município. Adquiriu o Sítio Caldeirão do Beato José Lourenço, importante referência da memória do nosso povo, e projetou a construção de um parque histórico na localidade. Valorizou o folclore e a cultura popular. Continuou o projeto do Cine-Teatro municipal Salviano Arraes Saraiva.

MOACIR SIQUEIRA – Assumiu a gestão após o falecimento de Raimundo Bezerra e, talvez por sua inabilidade político-administrativa, não deixou, a meu ver, marcas significativas no setor.

WALTER PEIXOTO (2ª gestão) – Extinguiu a Secretaria Municipal de Cultura e desprezou a Fundação Cultural J. de Figueiredo Filho.

SAMUEL ARARIPE – Recriou a Secretaria Municipal de Cultura e fortaleceu a Fundação Cultural J. de Figueiredo Filho. Democratizou a gestão cultural com a realização de conferência e criação do Conselho e do Fundo Municipal. Implantou o Sistema Municipal de Cultura, inserindo-o no contexto dos sistemas estadual e nacional. Apóia o folclore, a cultura popular, ong’s e eventos em todo o município, mantendo, para isso, amplo e diversificado calendário em parceria com vários setores da sociedade. Criou escolas de arte e valorizou a histórica Banda de Música Municipal. Construiu o Centro Cultural do Araripe, revitalizando o antigo Largo da RFFSA e preservando aquele patrimônio histórico e arquitetônico. Recriou o festival de música, hoje denominado Festival Cariri da Canção, que traz as modalidades estudantil (local) e nacional.

Com o breve relato, e a partir da minha vivência, classifico a gestão de SAMUEL ARARIPE como a de melhor desempenho na área da cultura, segmento a que estou diretamente ligado através de minha atividade artística, desde os tempos de amador até a atual fase profissional.

No que diz respeito ao incremento das ações desenvolvidas no Centro Cultural do Araripe, tema da sessão, sugiro que seja realizado um seminário do Conselho Municipal de Cultura aberto à participação de artistas das várias linguagens, comunidade (principalmente a do entorno), vereadores, empresários, ONG’S CULTURAIS, SESC, SEBRAE, CCBNB, Ministério Público e gestores municipais, com o fim de traçar uma política de ocupação permanente e alternativas concretas de financiamento.

Era isso o que eu queria dizer ontem na Casa do Povo e infelizmente fui impedido...

Crato, 26 de outubro de 2011.

Cacá Araújo
Cidadão, Artista, Professor

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