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segunda-feira, 27 de julho de 2009

Sarney se apequenou diz Tasso em entrevista à Época




“O Sarney se apequenou”. Esse é o título da entrevista publicada na edição desta semana da Revista Época (circulação nacional), com o senador Tasso Jereissati. Nela, o ex-governador cearense fala da crise no Senado e dos fatos envolvendo o presidente da Casa, José Sarney.
Amigo no passado, o senador diz que o presidente do Congresso representa hoje uma “coisa inaceitável”

A entrevista na íntegra


O senador Tasso Jereissati e o senador José Sarney já tiveram relações muito próximas – inclusive familiares. O sogro de Tasso, o empresário cearense Edson Queiroz, era amigo de Sarney. Foi sob o incentivo de Sarney que Tasso, então uma jovem liderança empresarial, entrou na política na década de 80 e virou governador do Ceará, pela primeira vez, em 1986. Quando Sarney era presidente da República, Tasso só não virou ministro da Fazenda por causa de um veto de Ulysses Guimarães. Mas a crise do Senado afastou os dois. Na eleição para a presidência da Casa, em fevereiro, Tasso votou contra Sarney. “Disse ao Sarney que ele estava representando uma coisa inaceitável”, afirma Tasso. “Ele está representando a pequenez da vida pública brasileira.”


ÉPOCA – O senhor teve relações muito próximas com o presidente do Congresso, senador José Sarney (PMDB-AP). Hoje, Sarney diz que o senhor é motivo de grande decepção para ele. Por que a relação do senhor com Sarney mudou?


Tasso Jereissati – Um dos grandes constrangimentos políticos de minha vida foi votar no Tião Viana (PT-AC, candidato à presidência do Senado em fevereiro) contra o Sarney. O Sarney tem um papel extraordinário na política brasileira. Ele levou o país a sair da agudeza do regime autoritário de uma maneira suave, que dificilmente outro político conseguiria, por causa de seu temperamento democrático. Antes da eleição para a presidência do Senado, ele me disse que não era candidato, que era uma loucura, que não tinha nem idade. Depois, mudou de ideia. Eu me preocupei com ele por estar colocando a história dele a serviço de um grupo dentro do Senado claramente deteriorado. Disse isso a ele, com enorme constrangimento, pessoalmente e na tribuna do Senado no dia da eleição. No discurso, disse a ele que enaltecia os seus aspectos posit ivos, mas que ele estava cometendo um grande erro e representando, naquele momento, uma coisa inaceitável.


ÉPOCA – O que representa o senador Sarney hoje? Tasso – A imprensa se concentrou nele, e isso é injusto, porque tem gente pior. Mas ele está concentrando todos os defeitos do nepotismo, do fisiologismo, da acomodação pessoal, do aproveitamento da vida pública para vantagens específicas. Ele está representando a pequenez da vida pública, em vez de representar o lado grande do homem público, que ele representou na Presidência da República. O Sarney se apequenou.


ÉPOCA – O senhor foi um dos amigos mais próximos do senador Antônio Carlos Magalhães nos últimos anos da vida dele. Sarney e ACM são homens da mesma geração. ACM teve de renunciar ao mandato de senador por causa de um escândalo. A presidência do Senado representa uma maldição para certos políticos? Tasso – Há uma diferença importante entre Sarney e o Antônio Carlos. Eu costumava dizer o seguinte: se você pegasse o temperamento do Sarney e juntasse a ele os homens públicos que cercavam o Antônio Carlos, você teria um dos melhores políticos do país. Mas, se você juntasse o temperamento do Antônio Carlos com os homens que cercam o Sarney, você teria um dos piores políticos do país. Apesar de serem da mesma geração, o ACM era um formador de líderes. Suas administrações sempre eram da melhor qualidade. Já o Sarney sempre se cercou muito mal.


ÉPOCA – O líder do PMDB, senador Renan Calheiros (AL), é uma dessas influências nefastas junto a Sarney? Tasso – O senador Renan Calheiros hoje controla uma boa parte do PMDB, que dá o tom no Senado. Ele é o homem forte da Casa. Essa boa parte do PMDB é um partido estranho. É um partido que não propõe chegar diretamente ao poder. Mas indiretamente, por meio de uma barulhenta maioria congressual, e assim mandar no governo independentemente da cor que ele tenha. É um partido que não faz meu gosto.


ÉPOCA – Por que o Senado chegou a essa crise tão profunda?

Tasso – O grande erro do Senado foi a perpetuação do poder do (ex-diretor-geral) Agaciel Maia por 15 anos. Concentrada na mão de um homem só, que gerenciava tudo – fazia cargos, contratos de compras, licitações, lidava com verbas enormes e secretas –, a prática de fisiologismo e concessão de favores cresceu, e o Senado virou esse monstro de 8 mil funcionários, que ninguém controla e sabe o que faz. Na campanha pela presidência do Senado, o Tião Viana trouxe uma proposta de rompimento com isso aí. O PSDB saiu da linha de oposição ao PT para apoiar o Tião Viana, porque percebemos que estava em jogo a instituição do Senado. Mas o Tião foi abandonado pelo Lula. Por isso, eu digo que o Lula está na gênese e no agravamento da crise do Senado.


ÉPOCA – Por que o presidente estaria na gênese de uma crise no Legislativo?

Tasso – O Lula adotou um sistema de poder na relação com o Congresso na base da cooptação. Ele não tem uma política de convencimento ou de doutrinação. Ele parte do princípio, que ele já manifestou uma vez, de que o Congresso é cheio de picaretas e sai cooptando, com cargos, obrinhas, emendas. Assim, ele constrói uma maioria tranquila. Uma ruptura com isso significaria se chocar com esse grupo político que lhe dá sustentação na base da cooptação. Ele fez uma opção que já tinha feito lá atrás, com o mensalão, e agora consolidou ao abandonar seu correligionário, que queria romper com isso. Recentemente, quando o próprio PT tentou dar um grito de independência, ele deixou claro: quem manda aqui sou eu, e meu sistema é esse. O Lula institucionalizou o que está acontecendo hoje no Senado.


ÉPOCA – Mas a barganha entre o Legislativo e o Executivo existia no governo Fernando Henrique Cardoso. O senador Renan Calheiros foi ministro da Justiça de FHC.

Tasso – O (então governador de São Paulo Mário) Covas chiou, e o Renan não ficou muito tempo. Essa barganha existia em seus nichos e era feita com certa discrição, uma certa vergonha. Agora, foi banalizado. Tornou-se a regra. O jogo de repartição de verbas, emendas entre prefeitos e deputados está institucionalizado. São exceções os deputados que não participam do jogo de emendas e serão capazes de voltar ao Congresso.


ÉPOCA – O senhor já teve ótimas relações com o presidente Lula. Chegou a cogitar a formar uma chapa presidencial com ele em 1994. Por que suas críticas a ele hoje são tão duras?

Tasso – Pessoalmente, eu gosto muito do Lula. Lá atrás, nós achávamos que formávamos um casal perfeito. Eles tinham a base social, e nós tínhamos os quadros para fazer um projeto para o país. Isso não foi possível. A eleição do Lula foi um avanço para o país, e o Brasil, depois do Lula, é outro. Mas, de um determinado ponto em diante, eu tive uma grande desilusão ao ver a maneira que o presidente considerava correta de se consolidar no poder. Não estou fazendo nenhuma acusação moral a ele. Mas, em cima de sua enorme popularidade, ele chancelou a canalhice, a corrupção e o fisiologismo no Brasil. Hoje, o Brasil vive uma crise moral enorme por causa disso e as instituições estão apodrecidas.


ÉPOCA – Essa crítica moral ao governo e a seus aliados não perde eco por causa de situações como a do líder do PSDB, o senador Arthur Virgílio (AM), que pediu dinheiro emprestado ao Agaciel Maia?

Tasso – Acho que foi tudo explicado pelo senador Arthur Virgílio. Diante de uma situação de sufoco, ele fez a primeira coisa que lhe veio à cabeça. Na época, não mediu as consequências disso e assumiu agora o erro. Para mostrar sua independência, ele é talvez hoje o mais agressivo entre todos os senadores na cobrança do próprio Agaciel.


ÉPOCA – O senhor usou a cota de passagens aéreas do Senado para fretar aviões. Isso não é uma vantagem indevida?


Tasso – Como não usava as passagens, acumulava um crédito a cada mês para mim. Como eu tinha esses créditos, fiz uma consulta se poderia usá-los quando precisasse fretar avião para me deslocar dentro do país. Foi-me dito que sim. O Agaciel disse que estava permitido e vários outros senadores fizeram o mesmo. Eu então usei essa verba de passagens para fretar avião. Mas, como eu tinha sido do grupo que atacava o Agaciel, eles tentaram usar essa informação para me atacar e dizer que eu usava a cota de passagens para pagar combustível de meu avião, o que não era verdade. Não tenho a menor dúvida de que agi corretamente, tanto é que quem deu às notas ao jornal Folha de S.Paulo fui eu. Mas reconheço que aquilo era uma prática que hoje a opinião pública não aceita mais. Se essa era uma mordomia indevida, então que se proíba. E agora eu não faço mais.


ÉPOCA – Qual é a solução para o Senado?

Tasso – Na primeira semana de agosto, o presidente Sarney vai ter de fazer uma proposta profunda de reforma. Não é só mudança administrativa. É mudança de hábitos e de cultura dentro do Senado. Tem de reverter toda uma cultura de mordomias e apadrinhamentos. Isso passa por uma reforma política e do orçamento. A principal arma de cooptação do governo é feita em cima da liberação das emendas parlamentares. Mudar isso não é uma coisa simples, mas tem de ter um líder que seja capaz de fazer.


ÉPOCA – Sarney tem condições de liderar essa reforma?

Tasso – Acho muito difícil. Ele vai ter de fazer um esforço pessoal gigantesco para entender a dimensão do papel que ele tem a partir do mês que vem.


ÉPOCA – Um ano atrás, a oposição era favorita na sucessão presidencial, com os governadores José Serra e Aécio Neves. Hoje, o cenário é diferente, com a ascensão da candidatura da ministra Dilma Rousseff. Qual é a chance de vitória da oposição em 2010?


Tasso – Eu nunca achei que seria fácil. O PT e o presidente Lula têm provado que sabem usar de maneira muito hábil o poder do ponto de vista político e eleitoral. O crescimento da ministra Dilma era esperado. Se você fizer uma análise, o nível de exposição da ministra Dilma na mídia nos últimos 12 meses deve ser maior que a da Xuxa, da Ivete Sangalo e do Roberto Carlos juntos.
ÉPOCA – O que o PSDB tem de fazer?


Tasso – Nós temos de ter uma definição do candidato nos próximos quatro, cinco meses. O partido tem essa obrigação. Nós não podemos ficar esperando a definição de um ou de outro candidato, conforme as circunstâncias. Nós temos de ter nosso candidato para ele mostrar que o Brasil está sem projeto.


ÉPOCA – O governador Serra lidera as pesquisas. Ele deve ser o candidato?

Tasso – O governador Serra tem grande experiência, já foi testado em nível nacional e tem o recall (memória do eleitor) de uma eleição presidencial. Está na liderança, mas não está crescendo, porque está muito recolhido. O Aécio virou uma referência de administração pública em um dos maiores Estados, tem carisma pessoal e um potencial muito grande. Com qualquer um dos dois, estaremos bem.


ÉPOCA – Uma chapa presidencial com os dois é possível?

Tasso – Uma chapa puro-sangue é possível, mas é uma hipótese remota. O problema é saber quem é o vice (risos).


ÉPOCA – O que o senhor acha da ideia de Ciro Gomes, seu aliado no Ceará, de ser candidato a governador em São Paulo?

Tasso – O Ciro tem condições de ser candidato a governador em qualquer Estado, principalmente em São Paulo. Mas minha sensação é que o Lula está doido para se ver livre dele como candidato à Presidência. O PT quer fazer uma campanha plebiscitária. Qualquer outro candidato aliado atrapalha essa estratégia.


ÉPOCA – O que o senhor fará em 2010?

Tasso – Não sou candidato ao governo do Ceará. Já fui governador três vezes. Se for candidato, serei candidato à reeleição.


ÉPOCA – O senhor não coloca isso como uma certeza?

Tasso – Acho difícil colocar. Com todas as coisas que estão acontecendo no Senado, podemos todos sair desmoralizados dessa história. Você olha a composição do Conselho de Ética e vê que aquilo está montado para virar um circo e uma farsa grotesca. Como fica nossa imagem? Eu estou muito deprimido com o que está acontecendo no Senado. Às vezes, eu sinto vergonha de ser senador.