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domingo, 28 de setembro de 2008

ZÉ, ESTE OURO SE ENCONTRA NA RAIZ DE TEU OUTRO NOME

Um século mais novo que eu, mas certamente um irmão sanguíneo no sentido literal. Um irmão mais novo que, no meu carinho arrevesado de nordestino, tanta provocação fiz. Era um miudinho bom de mexer. Por tudo ficava zangado (antigamente minha gente), o meu filho mais novo já em fase de muda, também era igual. Melhor situando. Nasci um sanduíche entre duas mulheres uma mais velha e outra mais nova, só oito anos depois é que tive um irmão. Naqueles idos Zé Flávio, Almirzinho, Nivaldo e Joaquim Pinheiro (estes dois moram em Recife) eram meus verdadeiros irmãos. Com cada um deles tive contatos próprios. Zé Flávio, numa certa época era bem constante, pois além da mãe ser sobrinha da minha, os nossos pais eram sócios.

E agora José? Como seremos Vikings na Lagoa do Gravatá? Lutando as lutas mais ferozes que dois artistas hollywoodiano poderiam lutar? Atravessando fiordes descomunais, através de labirintos indecifráveis formados pela vegetação aquática. Nas ações perigosas em que os barcos emborcavam (um cocho imprestável para a finalidade devida, mas um bom flutuante). Conquistando as mulheres mais lindas de Hollywood e beijando-as com tanto fervor que pequenas manchas chupadas ficavam nos antebraços.

Zé e a aquela dieta de Semana Santa no inverno do Gravatá. Dona Maria, Seu Valdemar e o velho Oscar. E Maria? Aquele lindo rosto de índia com a memória da raça branca e artefatos dos negros. As chuvas que se casavam com o solo pedregoso do sertão e nele fertilizava uma variedade sazonal de legumes para os sertões: maxixe, jerimum, milho e feijão verde. O queijo de coalho soando como borracha à mastigação de um baião de dois, quente e acalentador na friagem das chuvas. O clarear da madrugada sobre a cerca do curral, um copo com o fundo coberto de açúcar para em seguida encher-se de leite mugido. Mais um pouco o café, leite quente e cuscuz de milho novo.

A manhã começava com as trilhas em busca do gado no pasto. Em que área pastavam? Subir a trilha do serrote, ladear as locas de pedras, uma semicaverna, cercada de imbés e cactos. A flor da coro-de-frade. A mais exótica flor que conheço. Plumosa, redonda e inchada feito um bolo no forno. Os coxins da cangalha eram preenchidos por tal pluma e todos os sertões assim eram transportados. Mais uma distância na trilha da caatinga e chegávamos à Lagoa da Besta, no alto do serrote, cercada de lajedos, com as margens preenchidas por variada nascença de cactos: xique-xique, rabo-de-raposa, coroa-de-frade, entre outros. A manhã satisfeita, os bezerros achados e sem bicheiras e voltávamos para a casa. Em seguida ao açude.

Raras vezes se tem a oportunidade de tamanha proximidade com os pais. Manoel Vieira, Zé do Vale, entre um visitante ou um morador tomávamos banho como se fôssemos todos iguais. Os adultos brincavam feito crianças em fantasia de trabalho e as crianças trabalhavam feito adultos em fantasia de brincadeira. Desafios de mergulho, de nado, de pular. E as gozações consequentes dos erros e acertos propostos. Quando a manhã terminava o almoço se tornava rara iguaria na cozinha da casa do vaqueiro. Na estação pós prandial, as redes que os adultos mergulhavam no sono e as crianças se aquietavam até se juntar com mais alguém e se aventurar nos arredores.

Brincar sob a copa da cajaraneira ou dos pés de umbu. Seguir até a loca da pedra na encosta do serrote e de lá avistar todo a planura do revelo sertanejo. Imaginamos que nos limites da visão chegávamos a enxergar as vertentes da chapada do Araripe. Foi nesta loca de pedra que o Velho Antonio Dão se escondeu com um rifle carregado para atirar em inimigos do cangaço. Naqueles idos nas locas de pedra a mais curiosa das coisas seria observar a destreza dos cabritos e bodes aos saltos, numa beirada de abismo, com tanta naturalidade que parecia parte móvel daquele granito sertanejo. Lá pelas 16 horas catar no mato gravetos de galhos secos e juntar no terreiro da casa para a fogueira da noite.

Mais um banho de açude. O jantar e a roda em torno da fogueira. Cadeiras comuns e algumas espreguiçadeiras faziam o grande evento da noite. Mas também uma roda em que estivesse Manoel Vieira e Zé do Vale se assemelhava a algo da era de ouro da Grécia, através das ruidosas ruas da Roma Imperial e na confluência entre o Império Bizantino e a Roma dos Papas. Isso tudo misturado com dois sábios que tinham raízes profundas na vida sertaneja, na rudeza cruenta do couro de animal e das pontas das varas no canto da cerca. Os vizinhos de alguns quilômetros se aproximavam, os moradores e a conversa se expandiam no maior teatro que jamais haverá outro igual. A não ser o próprio.

O teatro se dividia em duas partes. Uma plana formando a base, menor que a outra, abobada e envolvente. Nesta base plana, embora na redução da capacidade do olho humano, sentia-se pela linha do horizonte que muito mais distância havia que nossa pouca imaginação. Nesta base ocorria todo o horizonte de eventos da terra e suas manifestações. Inclusive nós. Já na abóbada, vez por outra singrava a luz direcionada dos primeiros momentos dos satélites artificiais, por lá eventos da crosta já fugiam para o teto universal e tão intensamente cheio de planetas e estrelas que o rebaixamento da imaginação desconhece. Literalmente, a não ser por nossa velha confiança na força de gravidade, estávamos a um passo de flutuar no universo real e infinitamente maior que o cotidiano urbano.

Agora Zé, façamos a contabilidade daquelas noites: a exata dimensão do sertão; somada das histórias locais; adicionadas da cultura ocidental; do teatro universal e das telecomunicações com o estrangeiro. Dos demais já falei, resta esta telecomunicação. Um rádio transglobe, com aquelas faixas que giravam com um botão, sintonizando a rádio de Moscou, a Voz da América, a BBC de Londres, alguma estação escandinava com música clássica, Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília. O saldo destas noites vale toda uma vida. Até a vontade de amanhecer e entardecer tantas vezes mais quanto possível.

Pois é Zé Flávio Pinheiro Vieira, não há um minuto que não valha um século de reflexão e um século que não valha uma noite estrelada com aqueles companheiros de então.

sábado, 27 de setembro de 2008

OS FILÓSOFOS DA BATATEIRA E O DÓLAR

Os filósofos da Batateira elaboram numa escala tão alta que não ouso falar deles no raio além dos limites do Crato. Eles poderiam sofrer capturas por parte dos pragmáticos de sempre, daqueles que só enxergam metas e objetivos pela frente. Vêm apenas os pontos de chegada, nunca se abeberam das margens naturais de sua jornada. Por isso me reserva muito descrever suas reuniões, como mais esta sob a ponte do Rio Batateira para a qual a convocação não constava de uma pauta.

Naquele princípio de conversa, sem um tema para discutir as conversas surgem espontaneamente. Como uma piada, muito inocente para o gosto humorístico atual, desenvolvida por Mitonho:
- Um casal estava apaixonado. Arriados os quatro pneus e mais o de suporte. Aí o rapaz questiona a moça "como vamos casar sem dinheiro?". Ela no desejo imediato responde "meu bem me basta olhar para você que a fome passa". Casamento consumado, vem a fome e a esposa se queixa. O rapaz estranha "mas você não disse que bastava me ver para que a fome passasse?". Ao que ela responde: "mas não estou nem te vendo?".

Chico Preto, o líder dos filósofos, aproveita a história de Mitonho para iniciar a conversa:
- É isso aí. Nós somos, talvez, o único animal com maior capacidade de elaboração interior. Somo animal de inteligência, temos estratégias para defender a vida, temos manhas, seduções, mentiras e verdades, temos filosofia e história. Temos técnicas para manipular o planeta e até o espaço interplanetário. Mas continuamos dependendo da matéria do planeta para chegar nos próximos minutos.

- Chico, peraí! – Chambaril levantou uma questão - E a nossa alma? Temos um espírito! Algo que supera esta matéria do mundo. Chico tem uma virtude: não é arrogante nem no olhar e nem na postura e argumenta com Chambaril:
- Até hoje só a morte supera a matéria. Mas a morte não é uma entidade, uma essência, a morte é tão somente um fato, uma ocorrência que até funciona como um marco de passagem, mas não um conteúdo independente do mundo. Ela é totalmente dependente que o fato se antecipe de nascimento. Então quando digo que a vida material das pessoas é muito significativa é porque se algum de nós deixar de trocar o ar do pulmão por mais de cinco minutos, já se encontra ameaçado. E cinco minutos não é nada na nossa vida.

Zé de Dona Maria levanta uma questão de condução da reunião:
- Mas qualé o assunto mesmo da reunião? Chico ajusta sua postura na fala e se responde: É a crise americana. Biô aproveita para dar umas estocadas na arrogância americana. Chico Breca diz que nada de ruim pode acontecer com o Brasil. Fan põe o indicador puxando a pálpebra inferior do olho e diz: não afeta? Olha aqui ó!" Na verdade muitas outras visões pessimistas e outras tantas de fé no sempre forte EUA surgiram pela voz de Placa Branca, de João Barros e até pela boca do pouco falador Pinga. Chegara a hora de um encaminhamento do assunto. Tantas visões, muitas em choque não levariam a nada.

Chico retomou a palavra:
- Na busca pelo atendimento das necessidades da vida material nós compramos e vendemos estes recursos. Isso já com dinheiro arrumando a conversa e uma bem dosada regra de convencimento chamada de preço. O valor em moeda do que tenho para comprar e alguém tem para vender. Depois o mundo ficou mais esperto. As pessoas envelhecem, se aposentam, adoecem, ficam inabilitadas para o trabalho e então como a moeda é a garantia de que pode operar no mundo material, a pessoa faz poupança para os tempos ruins. E aí surge mais outra coisa.

João de Barros passa a mão sobre a pança lustrosa e brinca: aí parou. Não tem mais o que se dizer. A poupança é o fim da linha. Chico ri, pois sabe que o João deu ênfase para que a próxima explicação ficasse didaticamente mais fácil: Não. Não é o fim da linha. Aí as pessoas que querem uma coisa, mas não tem todo o dinheiro, pega emprestado de quem tem poupança e devolve aquele dinheiro com juros para compensar e estimular o poupador a emprestar. Mas aí.....

- Égua ainda tem outro aí! – Com certa irritação Bacurim exclama. Chico explica: Tem. Como o poupador pode juntar muito dinheiro, ele não tem meios para saber se quem está pedindo emprestado tem ou não condição de pagar-lhe. O que ele faz? Entrega esta atividade para um Banco. Com isso o Banco passa a ser na verdade o grande analista da capacidade do solicitante de dívida e com isso o Banco vira o maior emissor de dívida do mundo material.

- Eita ferro! É os americanos escritim. Tudo é no banco. Quem tá quebrando são os bancos. – Grita Mitonho, mas Chambaril logo rebate: Uma ova. Quem vai quebrar são as pessoas que têm poupança. Quem é devedor é caloteiro, mas o poupador é o perdedor. Chico Breca dar uma paulada final: Como não existe uma categoria separada de poupador e tomador de empréstimo, a mesma pessoa é um e outro ao mesmo tempo, todo mundo tá fodido. E Chico completa: o pior de tudo é que pelos próximos anos o mundo vai funcionar assim como um queima de estoque para balanço. Vai ficar todo mundo tonto para saber o real valor das coisas. Vai ser assim como casal se separando, cada um querendo levar vantagem sobre outro, briga de todo tamanho, pois afinal aquele céu arrumado pelo dólar é quem está em crise.

- E é assim? Desta monstruosidade? – Pinga se preocupa e Chico explica: "É isso mesmo. Como é que o mundo vai funcionar com uma regra que está toda lascada? Ninguém olha mais para o dólar sabendo do que se trata. O Brasil, podem contar aí, vai passar por um pedaço muito ruim. Não adianta achar que o dia amanheceu igual, pois hoje ele é outra coisa.

Nisso passa uma ambulância do socorro de emergência com buzina a todo grito na direção do bairro. A reunião não tem mais quem segure. Filósofo é ingrato como todo ser humano. Surge uma novidade e todo mundo corre para saber do que se trata. Não tem nem ritual de encerramento. Cada um queria seguir à frente dos outros para se antecipar nas explicações. Os filósofos da Batateira estão ficando um tanto parecido com o meio acadêmico.

Internacional

Expulso por Chávez
José Miguel Vivanco, diretor da organização de direitos humanos Human Rights Watch, conta, pela primeira vez em detalhes, como foi deportado da Venezuela por divulgarrelatório sobre as arbitrariedades do governo chavista
Diogo Schelp
Gilberto Tadday e Fernando Llano/AP

O advogado chileno José Miguel Vivanco, de 47 anos, diretor da Divisão para as Américas da Human Rights Watch, uma das principais organizações de defesa dos direitos humanos do mundo, e seu colega americano Daniel Wilkinson foram expulsos da Venezuela há duas semanas, a mando do presidente Hugo Chávez. O pecado de Vivanco foi ter ido a Caracas para divulgar o relatório "Uma década sob Chávez: intolerância política e oportunidades perdidas no avanço dos direitos humanos na Venezuela". De seu escritório em Washington, Vivanco relatou a VEJA a sua expulsão, com detalhes inéditos.
Como foi a sua expulsão da Venezuela?
Depois de passar o dia divulgando o relatório, regressamos ao hotel por volta de 22h15. Ao entrar, percebemos que os recepcionistas e mensageiros olhavam para nós de maneira estranha, com um misto de preocupação e curiosidade. Mas não desconfiei de nada.
Os policiais estavam esperando por vocês na porta do quarto?
Sim. Daniel e eu subimos pelo elevador até o 14º andar e, quando chegamos, demos de cara com um grupo de pouco mais de vinte pessoas. Uma câmera de televisão foi, então, ligada e começaram a nos filmar. Um sujeito baixinho identificou-se como diretor de direitos humanos do governo venezuelano, título que me deu vontade de rir. Com a voz empostada, ele disse, todo solene: "Em nome do governo bolivariano da Venezuela, ordeno sua expulsão imediata". Ele falava como se lesse uma proclamação militar ou algo assim. O baixinho estava cercado por uns quinze homens à paisana, com rádio na mão e armados com pistolas. Havia também cinco sujeitos do Exército com uniforme de combate e fortemente armados.
O que o senhor fez?
Eu tratei de explicar que aquilo era uma irregularidade muito grave. O sujeito baixinho respondeu: "O senhor violou a Constituição ao ofender a Venezuela. Decreta-se, portanto, sua expulsão". Ele seguia repetindo isso como um robô. Era nítido que falava para ter suas palavras registradas pela equipe de televisão. Eu protestei: "Estamos neste país de maneira legal, com todos os documentos em ordem. Estivemos aqui para divulgar um relatório de direitos humanos e só porque o seu governo não gostou do conteúdo não tem o direito de nos tratar como se fôssemos delinqüentes perigosos". O baixinho respondeu: "Coopere, senhor Vivanco, porque esta situação pode ser muito mais difícil!". Eu exigi, então, o direito de falar com o embaixador chileno. Não permitiram. Reclamei: "Supõe-se que a Venezuela seja uma democracia, não uma ditadura em que o chefe de estado expulsa as pessoas no meio da noite". Nesse momento, um dos militares deu um passo à frente e gritou: "Chega de discussão!". Os outros brutamontes me cercaram. Pedi para ir ao meu quarto para pegar minhas coisas. Eles disseram: "Sua mala foi empacotada. Todos os seus objetos pessoais já foram recolhidos. O procedimento foi filmado". Eu protestei, dizendo que isso era um abuso.
Não lhe permitiram entrar em seu quarto?
Sim, porque eu precisava me certificar de que não haviam colocado algo na mala que pudesse me incriminar na alfândega, como drogas ou uma arma. Eu também precisava pegar meu passaporte e meus cartões de crédito guardados no cofre. Mal comecei a inspecionar minha bagagem e os capangas puseram-se a me empurrar e a gritar: "Já revistou, já revistou, vamos embora!". Eu virei as costas, saquei meu celular BlackBerry e tentei fazer uma chamada para o meu embaixador. Um dos brutamontes me empurrou, o outro torceu meu braço por trás das costas e um terceiro arrancou o celular da minha mão. Daniel tentou fazer o mesmo em seu quarto, mas eles quebraram o seu telefone. A TV estatal de Chávez filmou, mas não mostrou nada disso. Agarraram minhas coisas, colocaram-me para fora do quarto e foram me empurrando pelo corredor.
Seu colega foi junto?
Sim, mas primeiro tentaram nos separar. Como protestamos, levaram-nos juntos a um elevador de serviço. Entraram conosco o baixinho e cinco brutamontes. Eu ainda não havia conseguido recuperar o meu celular e estava com medo de que aqueles sem-vergonha ficassem com todo o meu arquivo pessoal, armazenado no chip. Comecei um empurra-empurra para pegar de volta meu aparelho, até que o elevador travou entre dois andares. Assim mesmo, eu continuei empurrando meus captores. O baixinho ficou em pânico e gritou: "Doutor Vivanco, por favor! Esta coisa ainda vai despencar e causar uma tragédia!". Eu disse: "Não paro enquanto não me devolverem o celular!". O baixinho mandou me entregarem o telefone, sem a bateria. Em seguida, os capangas começaram a pedir socorro. Era uma situação ridícula, uma verdadeira comédia. Imagine que aquilo deveria ser uma operação de segurança de alto nível do governo venezuelano, para expulsar dois supostos inimigos internacionais – e estávamos todos presos no elevador de serviço.
Como vocês saíram?
Vieram uns funcionários com ferramentas e conseguiram mover o elevador um pouco. Fui puxado para fora pelos braços. Na saída do prédio, havia meia dúzia de veículos 4x4 blindados, com vidros escuros, e umas sete motocicletas com policiais. O baixinho me disse: "Doutor Vivanco, a minha tarefa acaba aqui. Eu o deixo a cargo do coronel. Adeus". Eu disse: "O quê? O senhor está lavando as mãos pelo que pode nos ocorrer a partir de agora?" Aquele foi o momento em que mais tive medo. E se tudo o que acontecera até então fosse uma armação para nos fazer crer que estávamos a caminho do aeroporto, enquanto, na verdade, iríamos terminar na sede da Disip, o serviço de inteligência da Venezuela? Se fôssemos presos naquelas condições, sem ter conseguido avisar ninguém, o que poderia acontecer? Daniel e eu então decidimos, em uma rápida conversa, não entrar na caminhonete. Resistimos até que os brutamontes nos agarraram pelas pernas e pelos braços e nos enfiaram à força dentro do veículo.
Vocês foram levados diretamente ao aeroporto?
Sim. Chegamos ao aeroporto por volta de meia-noite e fomos levados à pista, sem passar pela imigração. O primeiro avião que eu vi de dentro do carro foi o da Cubana de Aviación. Pensei, então, que o pesadelo não havia terminado e enfrentaria coisa ainda pior. Só faltava estarem nos mandando para Cuba! Depois me lembrei que Caracas é a única cidade latino-americana com vôos diretos para Teerã, no Irã. Temi que, em vez de Cuba, pudessem nos meter em um vôo para lá. Felizmente, o avião era o da Varig. Fiquei mais tranqüilo. Subimos as escadas, sob insultos dos brutamontes.
O avião estava esperando por vocês?
Sim, o vôo ia para São Paulo e estava mais de duas horas atrasado. Os passageiros imaginavam, conforme nos contaram depois, que éramos amigos de Chávez e nos atrasamos porque ficamos em festa, celebrando com o presidente. Já as aeromoças brasileiras sabiam desde o início que se tratava de uma expulsão por razões políticas. Elas até nos permitiram ir ao banheiro dar um telefonema, enquanto o avião se preparava para decolar.
Houve algum problema na entrada na Venezuela?
Daniel e eu levamos a Caracas quatro caixas com cópias do relatório. Duas delas não chegaram à esteira das bagagens. Um funcionário da American Airlines, companhia na qual viajamos, nos ligou horas depois do desembarque, para relatar, constrangido, que a alfândega venezuelana havia confiscado as duas caixas, sob o argumento de que continham livros proibidos. Acredito que, na noite anterior à nossa expulsão, os agentes de inteligência da Venezuela leram o relatório. Chávez nos expulsou para mostrar o que acontece com aqueles que o criticam.
O governo venezuelano os acusou de estarem a serviço do governo americano. Faz sentido?
Isso é completamente absurdo. Temos inúmeras publicações condenando a administração de George W. Bush pela prisão de Guantánamo. Mas não há comparação entre a maneira de o governo americano reagir às críticas e a de Chávez. Cada vez que alguém se opõe ao chavismo, é classificado como golpista, reacionário e agente do império. Chávez faz isso para intimidar e para não ter de responder às críticas. A tática de seu governo é falsificar a verdade. Mentir, mentir e voltar a mentir. É assim que ele está acostumado a governar.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Boa notícia


Economia
Arrecadação federal bate outro recorde
25 de Setembro de 2008 17:53-->

A Receita Federal anunciou nesta quinta-feira que a arrecadação de tributos e contribuições federais em agosto somou 53,930 bilhões de reais – o maior resultado para o mês na série histórica. Segundo os dados, o valor representa alta de 4,27% em relação ao mesmo período do ano passado. De janeiro a agosto, a quantia recolhida pelo governo federal também bateu o recorde histórico e chegou à marca de 443,56 bilhões, 10,33% acima do registrado no mesmo período de 2007.

Um dos principais responsáveis pela arrecadação recorde foi o Imposto de Renda, com arrecadação de 129,3 bilhões de reais, sendo 61 bilhões de reais somente das empresas. O Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) teve arrecadação maior, compensando o fim da CPMF. No acumulado do ano, o IOF arrecadou 13,44 bilhões de reais, contra 5,34 bilhões de reais em igual período do ano passado. Fora isso, o governo também aumentou a alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) paga pelas instituições financeiras. Fonte: site da revista VEJA

Comentário:
Lembremos de outra Notícia, esta divulgada em 27-10-2007:
“O presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu hoje a prorrogação da cobrança da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira–CPMF. A PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que prorroga a cobrança da CPMF até 2011 está no Senado, onde enfrenta a resistência da oposição para ser aprovada. Lula acrescentou: “"Todo brasileiro de bom senso sabe perfeitamente bem que não há país ou empresa no mundo que possa prescindir de um imposto que lhe garanta R$ 40 bilhões no orçamento sem criar outro imposto. Até porque eles (os senadores oposicionistas) sabem que se não aprovar, quem vai perder é o povo brasileiro e o povo que se beneficia das políticas públicas que estão previstas nos investimentos do governo".

quinta-feira, 25 de setembro de 2008


Milagre e martírio em Juazeiro
Lucho Torres Bedoya


Amanhã (26) e nos dias seguintes, 27 e 28, realizar-se-á, em Fortaleza, o Seminário Estadual em Ciências da Religião intitulado: Milagre, Martírio e Protagonismo da Tradição Religiosa Popular de Juazeiro: Pe. Cícero, Beata Maria de Araújo, Romeiros/as e Romarias. O evento é promovido pelo Instituto de Ciências Religiosas - Icre. O assunto, que continua a despertar interesse, suscitando reações e posicionamentos diversos, será abordado em intensa programação que consistirá de conferências, seminários temáticos, oficinas, mesa redonda e atividades artístico-culturais (sala de exposição, teatro, repentes, e apresentação musical), oferecidos por pesquisadores qualificados da área e por conhecidos mestres da cultura.

O evento possibilitará a divulgação dos resultados da pesquisa recente a respeito do peculiar fenômeno cultural, social, religioso acontecido em Juazeiro em torno de Pe. Cícero, Beata Maria de Araújo e o movimento das romarias. Propiciará, também, o encontro de pesquisadores, professores e estudantes em Ciências da Religião do Estado na perspectiva de lançar o Fórum Estadual em Estudos sobre Religião. O Seminário pretende resgatar para o Ceará este rico patrimônio cultural-religioso que lhe pertence. Para além de discussões religiosas confessionais, este fenômeno precisa ser melhor compreendido à luz da contribuição das Ciências da Religião. O evento vai mobilizar um público diversificado: ligado, principalmente, à comunidade acadêmica dos centros de ensino superior do estado, e aberto ao público em geral. O fato de realizar-se no antigo Seminário da Prainha, da Arquidiocese de Fortaleza, confere ao evento um significado especial, por ser esse o local onde Pe. Cícero fez seus estudos em Teologia.

Lucho Torres Bedoya - Coordenador do Seminário Estadual em Ciências da Religião

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Saiu na "Folha de S.Paulo", 23-09-2008

23/09/2008 - 05h29


Combate à corrupção "estanca" no Brasil, diz Transparência Internacional


da BBC Brasil
O combate à corrupção "parece ter estancado" no Brasil nos últimos anos, segundo o relatório anual da organização Transparência Internacional (TI), divulgado nesta terça-feira. O índice de percepção de corrupção --que reflete como cidadãos em diversos países vêem o combate a este mal-- calculado para o Brasil permaneceu em 3,5 pontos, intocado em relação ao ano passado, em uma escala que varia de 0 a 10. Segundo a ONG, a situação do Brasil é ilustrativa da regional: 22 dos 32 países da região incluídos no levantamento ficaram abaixo dos 5 pontos, o que indica problemas sérios de corrupção. Destes, 11 sequer passaram dos 3 pontos, marco indicativo de corrupção desenfreada. Em sua análise para as Américas, a TI qualificou os resultados como "tendência infeliz para a região nos últimos anos". "Os esforços anticorrupção parecem ter estancado, o que é particularmente perturbador à luz dos programas de reformas de muitos governos", afirma o comunicado da ONG. Judiciário A pontuação foi obtida pela análise de diversos indicadores --no caso brasileiro, sete foram utilizados como fonte. As pesquisas mostraram que a América Latina tem o pior nível de confiança no seu Judiciário: quase três em cada quatro latino-americanos entrevistados em dez países da região declararam acreditar que existe corrupção nesta esfera de poder, afirmou a TI. Além disso, 54% dos entrevistados em uma pesquisa no ano passado disseram esperar que a corrupção aumente nos próximos três anos --uma proporção que era de 43% há quatro anos. "Esses elementos comuns parecem ser fatores determinantes no perpétuo sentimento de impasse na luta contra a corrupção na América Latina e no Caribe", afirmou o documento. "A região avançou significativamente na adoção de convenções e instrumentos legais contra a corrupção, mas está claro que muitos países ainda carecem da aplicação efetiva da lei." O professor Johann Graf Lambsdorff, da Universidade de Passau, que elabora o Índice para a TI, diz que há evidências de que melhorar um ponto no índice de percepção da corrupção aumenta as receitas de um país em até 4%, e a afluência de capital em até 0,5% do PIB (Produto Interno Bruto).


"Desastre humanitário"


No mundo, a lista dos países com melhores e piores índices foi pouco alterada em relação ao ano passado.
Melhores
Dinamarca e Suécia lideram o ranking, desta vez ao lado da Nova Zelândia --o antigo terceiro lugar, a Noruega, ficou em 14º e foi uma queda marcante no relatório deste ano, notou a ONG. Piores
Já a Somália, Mianmar, Iraque e Haiti registraram os piores índices. A Transparência Internacional procurou destacar o que chamou de "relação fatal" entre pobreza, instituições decadentes e corrupção. O mal adicionará US$ 50 bilhões --cerca de metade do volume de ajuda econômica anual global-- ao custo de alcançar os Objetivos do Milênio em acesso a água e saneamento básico, estimou a ONG. "Nos países mais pobres, os níveis de corrupção podem ser a diferença entre a vida e a morte quando está em jogo o dinheiro que vai para hospitais ou para água potável", disse a presidente da TI, Huguette Labelle. "Os altos e persistentes níveis de corrupção e pobreza que assolam muitas das sociedades mundiais são o equivalente a um desastre humanitário e não podem ser tolerados." Ela notou que mesmo nos países ricos o problema é preocupante, normalmente por falta de uma legislação que fiscalize a atuação das grandes companhias em outros países.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

A ARTE COMO DISCURSO POLÍTICO

Na semana passada Frei Betto publicou no Globo um texto com o título de "O Presente Infindável". A seguir vem um resumo do artigo. "São muitas nostalgias e poucas utopias. O novo conceito de tempo é o da arte cinematográfica, não mais linear, histórico. No filme predomina a simultaneidade. Suprimem-se a barreira entre tempo e espaço. O tempo adquire caráter espacial e o espaço tempo. O tempo dar saltos, do passado para o presente e deste para o futuro. Não há continuidade ininterrupta. A única âncora é o aqui-e-agora do espectador. Não há durabilidade e nem direção irreversível. A pessoa está morta e nas telas continua um personagem jovem e ativo. Aos poucos o horizonte histórico se apaga e a utopia sai de cena. Não há, como no Ecleisastes, tempo para construir e tempo para destruir; tempo para amar e tempo para odiar; tempo para fazer a guerra e tempo para restabelecer a paz. O tempo é agora, um tempo sobreposto de construção e destruição, amor e ódio, guerra e paz. A felicidade deixa de ser um projeto temporal, reduzindo-se a apenas um mero prazer instantâneo, epidérmico, derivado da dilatação do ego (poder, riqueza, fama etc.). A utopia é privatizada. É apenas o êxito pessoal. A vida não se move por ideais e nem se justifica pela nobreza das causas abraçadas. Basta ter acesso ao consumo que propicia valor e conforto. O Céu na terra – prometem a publicidade, o turismo, o novo equipamento eletrônico, o banco, o cartão de crédito etc. Nem a fé escapa à subtração da temporalidade. O Reino de Deus deixa de ser esperado lá na frente para ser esperado "lá em cima". A fé reduz-se à esperança de salvação individual. Uma mesma pessoa vive diferentes experiências sem se perguntar por princípios éticos, políticos ou ideológicos. Finalmente ele termina o texto com algo positivo sobre esta simultaneidade, que seria a busca da interioridade. Do tempo místico, do tempo absoluto. Tempo síntese/supressão de todos os tempos. Eis que irrompe a eternidade – eterna idade. Onde a vida é terna. Nas artes, a música e a poesia se aproximam desta simultaneidade que volatiliza o tempo, imprimindo-lhe caráter atemporal. Na música, nossos ouvidos captam apenas a articulação de umas poucas notas. No entanto, perdura na emoção a lembrança de todas as notas que já soaram antes. Em si, a melodia é inatingível, assim como o poema, uma sucessão rítmica de sílabas e palavras sutis. O que existe é a ressonância da nota e da palavra em nossa subjetividade. A seqüência se instala em nós. Não é o tempo fatiado em passado, presente e futuro. É o presente infindável. O tempo infinito. Como no amor, em que o cotidiano é apenas a marcação ordinária de uma inspiração extraordinária."

O texto de Frei Betto deve tocar fundo os corações de muitas pessoas que sente profundamente a evolução dos tempos presentes. Por isso mesmo é preciso contemplar que a arte cinematográfica não é a causa disso tudo. Apenas reflete um ordenamento da vida social e econômica que tem por eixo exatamente esta simultaneidade de vida. Em última análise uma conformação intelectual e sensitiva com uma realidade efetivamente imposta, histórica, pois terá fim, fruto de movimentos sociais e políticos. Enfim, toda esta volúpia de poder e riqueza é a regra do ordenamento geral. Afinal o cinema é uma mera narrativa da "ideologia" desta ordem, pode ser um pouco mais, se apresentar como crítica a ela, mas convenhamos que neste quase século e meio de sua existência ele é pouco demais para o tempo da história.

O outro dado a se considerar é o papel da música e da poesia com o qual Frei Betto explicita uma verdadeira experiência mística. Neste sentido a alma do frade se encontra num estágio por demais contemplativo para que ele se dê conta da força de sua argumentação na primeira parte do artigo. Seria como se diante de tanto desalento frente ao quadro geral da humanidade, nele encontrasse uma pepita brilhante com a qual pudesse finalizar de modo positivo o seu pessimismo introdutório. Mas também isso não é possível. Afinal a música e a poesia não se colocam em "categoria" distinta do cinema. Aliás, todos são partes dos mesmos recursos culturais dos tempos atuais. O próprio Nietzsche em suas diatribes contra Wagner, quase que na escala do dissabor pessoal, já alertava isso em relação à música. É que a música e a poesia são "discursos" humanos, históricos, providos de toda carga de tempo, assim como o cinema, portanto de ideologia, com intenções de se tornarem politicamente dominantes. No meu entender, por mais que gostasse de navegar na utopia de Frei Betto, não pude deixar de pegar na maçaneta da porta do tempo em que estes ficam para trás e um novo tempo se abre como uma utopia datada, mas certamente no território da humanidade.

Custos da Monarquia



Rogério da Silva Tjader (*)



Anos atrás, a revista Time publicou um artigo sob o título “A Magia da Monarquia Continua”, no qual constava textualmente:
“Uma das principais críticas à Monarquia consiste em dizer que ela é demasiadamente dispendiosa. Mas os Presidentes de Repúblicas também gastam e não estão aptos a governar com reis e rainhas que para isso foram educados. E os Presidentes nem sempre são tão honestos como eles, desde os europeus até os asiáticos.”
Por ocasião da independência da Noruega, quando o Parlamento votava a forma de governo a ser adotada, a Monarquia foi escolhida por 100 votos contra 4 a favor do regime republicano. Nansen – o Presidente do Parlamento – justificou o resultado dizendo:
“Optamos pela Monarquia por 3 razões básicas: é muito mais barata, concede mais liberdade, além de ter mais autoridade para defender os interesses nacionais”.

(*) Rogério da Silva Tjader é professor de História, titular em várias Faculdades, no Estado do Rio de Janeiro.

Duas cenas na vida do Padre Cícero


CENA 1

A família chegou ao Juazeiro, num carro de boi, depois de longos dias de caminhada pelo sertão poeirento do Nordeste. Pai, mãe, dois filhos e duas filhas conduziam um terceiro jovem, também filho do casal, possuído por maus espíritos, a fim de que o Padre Cícero lhe tirasse “o cão do couro”, expressão utilizada naquele tempo e correspondente hoje à palavra exorcismo. Colocado na sala de visita da casa do sacerdote, o rapaz, todo amarrado, espumava e urrava feito bicho bruto, querendo se ver livre das fortes cordas que o imobilizavam. Nisso, entra o Padre Cícero com um vidro de água benta na mão direita. Espargiu o líquido sobre toda a sala e em seguida ordenou: “tirem as cordas do rapaz”. Apesar das ponderações da mãe do moço, alertando que se ficasse livre das amarras o filho agrediria a todos, o Padre Cícero insistiu: “soltem o rapaz”. E começou a rezar em latim, jogando água benta no moço, que foi se acalmando até ficar totalmente sereno. A calmaria voltou ao ambiente. Padre Cícero recomenda dar uma xícara de líquido ao jovem, na parte da tarde, e leva-lo para descansar. Dias depois, os membros da família voltam à casa do Padre Cícero. Vieram agradecer ao sacerdote por ter livrado o filho dos maus espíritos. E retornaram, em seguida, para as paragens de origem.

CENA 2

A mesa de refeição da casa do Padre Cícero era sempre farta, embora ele próprio se alimentasse frugalmente. Diversas pessoas procuravam diariamente sua casa, nas horas das refeições, numa verdadeira exploração a conhecida hospitalidade do sacerdote. Por outro lado, todos os dias uma pequena multidão se formava, defronte a sua residência, buscando ter acesso ao velho padre. Ele recebia a todos indistintamente. Ricos e pobres. Moradores do Juazeiro ou visitantes vindos de diversos rincões do Nordeste. Nos últimos tempos, é bem verdade, a beata Mocinha fazia uma triagem dos visitantes a serem introduzidos ao sacerdote, pois era impossível o Padre atender a todos. Ele ouvia pacientemente todos os visitantes. Certo dia, uma mulher conduzindo nos braços uma criança furou a fila das pessoas a serem recebidas pelo Padre Cícero e, em alta voz, de forma impertinente, disse que uma parte da casa dela tinha ruído. Disse mais: cachorros e porcos invadiam o que restava da sua morada e ela não tinha condições de continuar mais lá. Pediu ao Padre Cícero uma ajuda. O velho sacerdote havia recebido, pouco antes, um donativo em dinheiro, e tinha colocado no bolso da batina a importância sem conferir. Pelo volume era uma boa quantia. Naquela mesma hora, Padre Cícero pegou aquele dinheiro e repassou toda importância para a mulher. Esta saiu demonstrando muito contentamento, pois, provavelmente, em toda sua vida, nunca tinha colocado tantos réis nas mãos...

Nota: as cenas acima foram relatadas por Maria Assunção Gonçalves, que conviveu com o Padre Cícero, ao autor destas linhas, e gravadas em julho de 2004.


Armando Lopes Rafael

sábado, 20 de setembro de 2008

ONDE ANDA VOCÊ?

O que deu errado? Uma longa fase de crescimento rápido, inflação e juros baixos e estabilidade macroeconômica gerou complacência e elevou a disposição para riscos. A estabilidade levou à instabilidade. (Martin Wolf – Financial Times)




Afinal o que ocorre? Para alguns é o movimento pendular do capitalismo entre o Estado e o Mercado. Por ocasiões o pêndulo tende para o mercado livre, auto-regulado, um ente racional que aposta nas melhores soluções e todos vivem felizes. Por outra é o Estado, regulador, indutor de estratégias, com proteções sociais e a igualdade traz a paz. Mas é isso mesmo o que ocorreu entre os anos 80 e estes 10 primeiros anos do século XXI, compreendido como o da era Teatcher-Reagen?

Aí dizemos dos Estados enfraquecidos, insuficientes para coisas complexas. Estados enxugados e reduzidos a uma linha de base que não interviesse nas leis de ouro do capitalismo. Aliás, cada vez mais as leis do capitalismo se reduzem a uma única: demanda e oferta. Uma vez deixada ao sabor dos seus movimentos, os agentes racionais, que se disseminam no mercado, conhecem exatamente a estrutura da economia e deste modo são capazes de se antecipar à evolução dos fatos. Aí o mundo segue. Mas o mundo é como um animal mesmo, mais que o outro animal do mercado, agita-se e a racionalidade perde a tramontana. Só não se imaginava que um ultra liberal como Martin Wolf viesse dizer que a regra de ouro, ela mesma, levasse à crise.

Mas tem um dado que nos deixa mais confusos. E confusão como sintoma mesmo de um contraditório que atravessa nossa visão, mas não o entendemos, pois nosso modelo de mundo racional se antepõe a esta visão. Ambos não combinam. Qual seja, se o neoliberalismo enxugou os Estados, levou tudo ao Estado Mínimo, que tanta grana é essa que sai das burras dos Estados nacionais para encher as malfadadas ações do mercado? Então o Estado era mínimo, mas o caixa era máximo? O Estado nada podia, era insuficiente e agora pode tudo, até nos salvar de uma quebradeira ao estilo anos 30? O Estado pode fazer guerra ao terrorismo, punir nações não pagadoras, punir populações rebeldes? Tem algo efetivamente contraditório nisso tudo.

Uma maneira de dirimir a contradição é contemplar se efetivamente ela existe. E ao que tudo leva a crer ela não existe. Jamais o capitalismo pôde abdicar dos Estados Nacionais. Apenas precisava limar limites nacionais para que os capitais, especialmente o financeiro, pudessem fazer o jogo livre de "novos produtos" para ganhar dinheiro, inventar a securitização, os derivados e jogar solto na face oculta da Globalização. Mas aí vem a revelação clara da era neoliberal: não se tratava de reformas para o livre mercado, mas de controle sobre os ganhos do trabalho e a proteção social que os movimentos trabalhistas haviam implantado nas sociedades do pós-segunda guerra.

A prova cabal foi a ampliação a quase início do século XX das desigualdades sociais em todo o ocidente. E agora que os Estados têm que salvar as empresas, como fica a questão do trabalho e das sociedades? Será muito pouco improvável que uma crise social não surja deste cenário. Uma crise social que tenderá a rever todo o rebaixamento da vida dos trabalhadores. Não é possível que após a farra das empresas um novo arranjo não se faça. Uma das coisas que mais chocou nos fatos da agonia do Leahman Brothers não foi apenas a sua quebra, mas essencialmente reconhecer-se que o banco operava com produtos fora da regulamentação, "inovadores" e o pior de todos os pecados, não contabilizados.

Uma contabilidade mentirosa, que não revele a verdadeira situação das empresas, é um dano irreparável ao capitalismo. Especialmente ao que resta de vida nele que são os chamados "agentes racionais" pois como este poderão tomar atitudes racionais se as informações não se ajustam à realidade? E vejamos que isso é um grande problema nos EUA, todas as famosas agências de risco erraram feio em sua previsão. Todas estão no furacão da crise, prestes a quebrar ou serem vendidas. A racionalidade esteve a serviço do irracional.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

O CURTA "AS SETE ALMAS SANTAS VAQUEIRAS" SERÁ EXIBIDO EM BREVE

Nas últimas semanas de agosto encerraram-se as gravações de “As Sete Almas Santas Vaqueiras”. Trata-se de um curta-ficção dirigido por Jackson Bantim. A maior parte das filmagens foram realizadas em Santa Fé, distrito de Crato, localizado a 20 quilômetros da Sede municipal. Reunindo equipe e elenco da terra, o filme evoca a mitologia caririense inspirada na memória de contadores de histórias da região.


A história narra a vida do vaqueiro Anacleto de Mãe que, depois de uma vida pregressa desregrada e libertina, perde sua família e seus bens, vivendo desolado, arrependido e na penúria; busca superação de seu infortúnio através da purificação pelas Sete Almas Santas Vaqueiras.

Foram gravadas mais de cinco horas de imagens. O diretor Jackson Bantim acompanha agora a fase de finalização do curta, que será editado pelo núcleo de produção audiovisual – IMAGO, vinculado ao Laboratório de Estudos e Pesquisas em Espaço Urbano e Cultura, da Universidade Regional do Cariri - URCA.

Agora a expectativa está para a estréia do filme com data prevista para o mês de novembro. Para a ocasião está sendo planejada uma programação que contará com exposição das fotos de cena (still) e exibição de making of.


Conheça a história da Bandeira do Brasil

Nossos símbolos nacionais, bonitos ou feios, certos ou errados, são os Símbolos da Pátria, e a eles devemos respeito. O Brasil tem uma das mais belas Bandeiras do mundo, criada com nossa Independência. Foi modificada ao longo dos anos, por conta das mudanças em nossa História, e só o tempo dirá se ainda terá outras modificações. A Bandeira Nacional, assim como o Hino, são os símbolos maiores da Pátria, e por isso devem ser respeitados e conhecidos. Tanto a nossa Bandeira quanto o nosso Hino Nacional foram criados na época do Império do Brasil, depois da Independência. Nosso Hino nos primeiros tempos não tinha letra, e a nossa Bandeira era um pouco diferente, e continha o Brasão Imperial. O verdadeiro significado das cores de nossa Bandeira Nacional não é conhecido pela maioria das pessoas. É muito comum falar-se em “verde das matas, o amarelo do ouro”, mas não é bem assim, ou pelo menos, não é só isso.
A História mostra o motivo:
As cores verde-louro e amarelo-ouro foram instituídas como cores nacionais do Brasil, 11 dias após a proclamação da Independência. A Bandeira do Brasil foi desenhada com as cores das Famílias Reais do nosso primeiro casal de Imperadores, Dom Pedro I e Dona Leopoldina. Dom Pedro I é representado pelo Verde-Bragança e sua esposa Dona Leopoldina, sendo filha do Imperador da Áustria, pelo amarelo-ouro dos Habsburgos. Em setembro de 1823, o futuro Marquês de Resende, Antonio Teles da Silva Caminha e Meneses, então Embaixador na Áustria, explicando o motivo da escolha do verde e do amarelo ao Príncipe de Metternich, disse que o "amarelo - simbolizaria a Casa de Lorena (Habsburg)", cor usada pela Família Imperial Austríaca, e o "verde - representaria a cor da Casa de Bragança".

Outro documento que comprova isso é uma carta: “datada de 15 dede 1822, ou seja, pouco mais de uma semana da Proclamação da Independência, é sabido que numa carta escrita por Dona Leopoldina à Dona Maria Tereza, da Côrte da Áustria, comenta textualmente, fazendo referência às cores da bandeira, dizendo do “verde dos Braganças e do amarelo-ouro dos Habsburgos” (Silveira, 1972, pag. 230).

O Decreto que criou nossa Bandeira

Segundo o livro "Símbolos Nacionais na Independência" de autoria do General Jonas Correia, o Escudo de Armas e Bandeira do Império foram criados por Decreto de 18 de setembro de 1822. Com relação a Bandeira o decreto diz: "A Bandeira Nacional será composta de um paralelogramo verde e nele inscrito um quadrilátero romboidal cor de ouro, ficando no centro deste o Escudo de Armas do Brasil"

Uma falsa Bandeira Nacional

Em novembro de 1889, um golpe militar derruba o governo imperial. Os golpistas, influenciados pelos integrantes da seita positivista, instituem uma bandeira provisória da República, na tentativa de abolir o símbolo de nossa Monarquia. Assim, copiam a bandeira do clube republicano Lopes Trovão, uma imitação da bandeira dos Estados Unidos da América. Essa falsa bandeira não foi aceita nem mesmo pelos mais radicais antimonarquistas, e durou apenas cinco dias. Infelizmente, foi essa humilhante imitação de bandeira estrangeira que foi içada no mastro do navio Alagoas, que levou o Imperador Dom Pedro II, prisioneiro e expulso com toda a sua família, para o exílio político mais longo da História do Brasil.

A identidade nacional falou mais alto

A Bandeira Nacional, então, foi motivo de acaloradas discussões. Alguns queriam destruir tudo o que lembrasse o Império, e apresentaram modelos de bandeiras listradas, com cores diferentes. Mas, o próprio Deodoro da Fonseca desejava manter a antiga Bandeira Imperial, dela retirando apenas a Coroa. Desta forma, estava decidido que as cores e o formato básico de nossa Bandeira permaneceriam.

(Transcrito do jornal “Correio Imperial”, de Belo Horizonte-MG)

A crise da Viação Brasília


Ceará
MOTORISTAS E COBRADORES
Greve deixa 100 mil pessoas sem ônibus no Cariri
Rita Célia Faheina, da Redação
Os grevistas cobram o pagamento dos salários, atrasados há dois meses; entrega de cestas básicas referentes há quatro meses; e o pagamento das horas extras desde 2006. Ainda não houve acordo com a empresa Viação Brasília

18/09/2008 01:22
Usuários dos ônibus da empresa Viação Brasília, que utilizam os coletivos nos trajetos entre o Crato, Juazeiro do Norte, Barbalha e Missão Velha, ontem, tiveram que recorrer a transportes alternativos. É que os motoristas e cobradores da empresa paralisaram as atividades. A greve foi parcial na última terça-feira, mas ontem, nenhum veículo circulou. Os trabalhadores cobram o pagamento dos salários, atrasados há dois meses; entrega de cestas básicas referentes há quatro meses; e o pagamento das horas extras desde 2006. Houve uma reunião, na noite da última terça-feira, de representantes dos trabalhadores com dirigentes da empresa, mas os dois lados não chegaram a um acordo. Com o movimento grevista, os usuários, em torno de 100 mil pessoas, que apanham os ônibus no triângulo entre Crato, Juazeiro do Norte e Barbalha (chamado triângulo Crajubar) tiveram de recorrer às vans que fazem o mesmo percurso.

"Lamento essa greve porque está prejudicando muita gente. Somos pessoas de menor poder aquisitivo e só podemos pagar a passagem (R$ 1,20) cobrada pelos ônibus", disse a dona-de-casa Maria Lúcia Pereira, que mora em Barbalha. Mas ela concorda que a reivindicação dos motoristas e cobradores é justa. "Seria necessário que resolvessem logo essa situação", completou. De acordo com a diretora administrativa da Viação Brasília, Lúcia Ferreira, a empresa tem despesa alta de combustível e com a manutenção dos veículos. E, segundo ela, caso não haja uma regulamentação dos transportes alternativos, a empresa vai ter de fechar as portas. Disse ainda que a diretoria está analisando as reivindicações dos trabalhadores e vão tentar atendê-las. Os ônibus da empresa Viação Brasília fazem a linha entre Crato e Juazeiro do Norte; Barbalha e Missão Velha; e Juazeiro do Norte e Missão Velha. Cerca de 60 vans fazem esses trajetos e o serviço do transportes alternativo entre essas cidades ainda não é regulamentado. Ontem, as vans transitavam superlotadas devido à paralisação dos ônibus. (Colaborou Amaury Alencar)

(Jornal "O Povo", 18-09-2008)

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Melhores processos, melhores gestores


Para se candidatar a um cargo do executivo, como o de prefeito por exemplo, o candidato, ao contrário de um pleiteante a uma vaga de juiz, promotor, professor universitário, médico ou dentista de PSF, não precisa ter título de pós-graduação, muito menos ter nível superior. Pode ainda pleitear o cargo, sem apresentar curriculum vitae, comprovando vínculos empregatícios anteriores, seus trabalhos desenvolvidos e respectivos resultados, munidos de boas “cartas de referência”. Pode participar de uma eleição sem ter inclusive as contas aprovadas, em caso de ter ocupado o cargo anteriormente.

Quando eleito, dispõe de 4 anos e se obriga apenas a prestar contas do dinheiro gasto. Pode parecer suficiente à primeira vista, mas para uma nação que clama por melhores oportunidades para todos, apresentar um projeto de governo, apontando claramente as metas a serem alcançadas fazendo uso do orçamento disponível, deveria ser obrigação. Complementarmente, deveria haver uma consulta anual, bienal ou ao final do mandato, para apontar o grau de satisfação do eleitor ao trabalho prestado pelo empossado, podendo esta inclusive vetar uma, possível, futura investidura deste a um outro cargo público. Sonho distante? Talvez. Mais que isso, caminho para mudar esta realidade que privilegia o candidato que tem mais dinheiro, ou é financiado por outros políticos, ao invés de termos servidores públicos, porque é isso que deveriam ser, aptos a gerir nossos impostos transformados em orçamentos também públicos. Jogue a primeira pedra quem achar que o sistema que está ai, não dá acesso a qualquer candidatura mal intencionada, motivada pela ausência de indicadores de qualidade e eficiência.

O sistema vigente não contribui à criação de um Brasil melhor, de menos desigualdade social, de real vislumbramento de um país soberano em suas decisões, de oportunidades iguais para todos. Nos dias de hoje, até o termo “político” parece ter o tom pejorativo, ligado muito mais a habilidade de formar conchavos em busca do número de votos necessário à eleição, do que à qualidade de coordenar ações, nas diversas esferas, que gerem benefícios a seus eleitores. Bom seria termos muitos pleiteantes qualificados e creditados a gerir a coisa pública. Melhor ainda, ver o dia em que estes cargos fossem, todos, ocupados por candidatos à altura da investidura.
Melhores processos, melhores gestores!

Dimas de Castro e Silva Neto, M.Sc.
Eng. Civil, Prof. do Curso de Engenharia Civil da UFC Cariri

A verdade concisamente


O MAU EXEMPLO BOLIVIANO
Otavio Luiz Rodrigues Jr (*)


Os jornais brasileiros dedicam espaços generosos à crise política na vizinha Bolívia. Bloqueio de estadas, interrupção no fornecimento de gás, piquetes e acusações de separatismo e discriminação. A sensação que se tem é a de estar diante da Torre de Babel, rediviva em pleno território latino-americano. Muito do que se observa hoje na terra de Evo Morales guarda coerência com acontecimentos do passado. Na realidade, a Bolívia é um país, no mínimo, singular.
Sem saída para o mar, cujo acesso foi perdido em uma guerra contra o Chile no século XIX, a Bolívia possui uma Marinha de Guerra. E um almirante! Do Lago Titicaca. O país expulsou o embaixador britânico em 1866. A rainha Vitória quis retaliar militarmente, mas foi dissuadida por seus ministros ante a insignificância estratégica da nação. Vitória teria apontado para o mapa e dito: "A partir de hoje, a Bolívia não existe mais". Um presidente boliviano, sincero admirador da França, organizou dois batalhões e seguiu marchando pela floresta por dois dias para socorrer o imperador Napoleão III, que lutava contra a Prússia. Só interrompeu a expedição quando lhe disseram onde ficava a França e que teria de atravessar o oceano Atlântico.
No século XX, a família boliviana Patiño era uma das mais ricas do mundo na exploração de estanho. Seus membros casaram-se com a nobreza européia e alguns tornaram-se "playboys" internacionais, ao lado de Porfírio Rubirosa. Em 1935, os bolivianos foram derrotados pelos paraguaios na Guerra do Chaco, com perda de extensa faixa de território. O resultado? Um desconhecido capitão, de nome Alfredo Stroessner, tornou-se herói nacional por liderar um ataque decisivo nessa guerra. Anos depois, Stroessner chegaria ao poder no Paraguai e nele permaneceria por quase 40 anos. Aos que se assustam com Evo Morales e suas políticas de divisão nacional, recordem-se que, em 1952, uma rebelião dissolveu o Exército, estatizou as minas e fez uma reforma agrária que abrangeu quase todo o País. A conseqüência? Pilhagens, rebeliões e massacres da população branca e de algumas etnias indígenas por outros índios.
Esses relatos, além de tragicamente pitorescos, servem para desconstruir duas inverdades ora repetidas à exaustão sobre a crise boliviana: a noção de que Evo Morales combateria forças reacionárias, de origem branca, em nome da distribuição igualitária de renda, e a visão de que os índios finalmente chegaram ao poder. Ambas as afirmações são equívocas. Os índios foram - e continuam sendo - os grandes protagonistas das principais rebeliões ocorridas no país, desde seu nascimento. Na verdade, muitos dos massacres ocorreram pela ação de índios contra índios. As tentativas de expropriação de bens privados, dentre esses os da Petrobrás, nunca chegaram a um resultado positivo. Apenas desarticularam a produção e atrasaram o país, ainda mais.
Um mérito pode ser atribuído a Morales: é perceptível a queda do nível de corrupção, um dos elementos desencadeadores de sua vitória eleitoral. Sua probidade pessoal, até o momento, é um elemento digno de respeito e tem influenciado no crescimento da Bolívia. No entanto, seu discurso baseado no ódio racial e na desforra histórica dos índios - a qual, como visto, não é verdadeira - conduziu sua nação ao estado atual de crise.
A única certeza é que essa não será a última das insurreições bolivianas. A esperança é que o modelo segregacionista de Morales não sirva de exemplo ao Brasil, que já possui problemas demais para importar o mau exemplo boliviano.

(*) Otavio Luiz Rodrigues Jr é doutor em Direito Civil (Universidade de São Paulo), membro da Asociación Iberoamericana de Derecho Romano, Oviedo, Espanha, professor universitário em Brasília (IESB, IDP) e Fortaleza (FA7).
(Artigo publicado no "Jornal do Cariri", edição 16 a 22 de setembro de 2008)

MEMÓRIA E PERSONALIDADE


Ibsen Noronha (*)

Um bom exemplo de recuperação de uma figura eminentíssima se deu na cidade de Crato


O filósofo francês Henry Bergson afirmava que uma pessoa que perde sua memória perde a sua personalidade. Palavras profundas que merecem uma breve reflexão.
De fato a memória é um dos nossos preciosos atributos personalíssimos. A dinâmica de nossas vidas depende, e muito, das experiências acumuladas ao longo de dias penosos ou alegres, fecundos ou estéreis.
Transpondo a afirmação de Bergson para uma perspectiva mais ampla, a perspectiva de um Povo, podemos afirmar simetricamente: um Povo que perde a sua memória perde a sua personalidade. Sob este ponto de vista recordar os momentos cimeiros das Nações é prestar grande serviço com o objetivo de consolidar um Povo com personalidade forte e cioso da grandeza do País.
O ano do Senhor de 2008 é um ano especialmente rico para o nosso Brasil. O maior orador sacro da língua portuguesa, o Padre Antônio Vieira, nasceu há exatos 400 anos. O Mestre da língua portuguesa, fundador da Academia Brasileira de Letras, Machado de Assis, deixou esta vida há um século. E são passados 200 anos desde que a Família Real Portuguesa transplantou a sede do Reino para este imenso Portugal chamado Brasil.
De fato, todas estas efemérides merecem lembrança, celebração e, mesmo, devoção. A História de um País se forma com grandes homens, que ousam ir além do quotidiano e marcar gerações com os seus “Christãos atrevimentos” – na marcante expressão de Camões!
Sobre a vinda da Família Real muito se tem escrito e falado. É bom sinal. A personalidade de Dom João VI, tão caricaturada e vilipendiada por uma historiografia amesquinhada e malsã, foi absolutamente revista e surgiu o estadista calmo e pacato, mas com visão profunda das realidades e capaz de decisões arriscadas e arrojadas.
Mas também as mulheres da Família Real vão sendo mais conhecidas e sua dignidade admirada... Um bom exemplo de recuperação de uma figura eminentíssima se deu na cidade de Crato. Há alguns anos, monarquistas do Cariri propuseram a vereadores um projeto que batizasse uma nova rua da cidade com o nome de Imperatriz Leopoldina. Os vereadores atenderam com presteza ao pedido. Contudo, deu-se o espanto quando a matéria foi colocada em votação! Alguns vereadores alegaram desconhecer tal Imperatriz e também seu importantíssimo papel na Independência do Brasil. O presidente da Câmara Municipal usou de sensatez.
Promoveu uma palestra sobre a nossa primeira Imperatriz. O projeto foi aprovado por 20 votos e uma única abstenção, de um vereador do PT. Sem dúvida o conhecimento da vida de Dona Leopoldina fortaleceu a personalidade dos edis de Crato e produziu um belo nome para a bela cidade do Cariri.
Infelizmente, noticiou-se a alteração posterior do nome, o que não tornam inválidas as observações aqui feitas sobre o valor do resgate histórico.

(*) Ibsen Noronha é Mestre em Direito pela Universidade de Coimbra, Portugal. É Professor de História do Direito em Brasília.
(Artigo publicado no “Jornal do Cariri”, edição de 16 a 22 de setembro de 2008)

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Ex-Arcebispo de Fortaleza rumo aos altares


Dom Antônio de Almeida Lustosa:
"Bispo brasileiro da justiça social" rumo aos altares
CIDADE DO VATICANO, domingo, 14 de setembro de 2008 (ZENIT.org).- A causa de beatificação do salesiano Dom Antônio de Almeida Lustosa, conhecido como o «bispo brasileiro da justiça social», deu um passo adiante.No último dia 10 de setembro, o Pe. Antônio da Silva Ferreira, colaborador para a causa do prelado, apresentou o texto da «Positio» ao relator da Congregação para as Causas dos Santos, Pe. Daniel Ols O.P.
Trata-se do dossiê que, com base nas atas da causa diocesana, deve demonstrar a heroicidade da vida e das virtudes, além da fama de santidade, do servo de Deus.«O Pe. Ferreira apresentou cinco grandes volumes de documentação e o relativo sumário, incluindo uma biografia, elaborada por ele com a competência histórica que todos reconhecem», informa a AINS, agência de notícias salesiana.Na cerimônia oficial de entrega participaram além do relator e do Pe. Ferreira, com seu colaborador José Pedro Menezes o postulador geral, Enrico del Covolo, seu colaborador Luigi Fedrizzi e Hilário Passero, salesiano brasileiro da Casa Geral.Dom Antonio de Almeida Lustosa (1886-1974), foi um dos salesianos mais importantes na implantação e difusão do carisma de Dom Bosco no Brasil.
Após ter sido diretor em Lavrinhas foi eleito, aos 39 anos, como bispo de Uberaba.Depois foi transferido à sede de Corumbá, e sucessivamente a Belém do Pará e a Fortaleza. Em 1963, após 38 anos de atividade como bispo, ele se retirou à Casa salesiana de Carpina, onde transcorreu os últimos 15 anos de sua vida. Morreu em 14 de agosto de 1974. Durante todo seu ministério, viveu intensamente o «Da mihi animas» de Dom Bosco. É considerado ainda hoje como o «bispo da justiça social».

sábado, 13 de setembro de 2008

Há 130 anos o Ceará era consagrado ao Sagrado Coração de Jesus


Há 130 anos – em 15 de setembro de 1878, quando o território do nosso Estado formava uma única diocese – o 1º bispo do Ceará, Dom Luiz Antônio dos Santos, junto com as autoridades civis e o povo de Fortaleza, fez a consagração do Ceará ao Sagrado Coração de Jesus. Àquela época o Ceará enfrentava o segundo ano consecutivo de terrível seca que trouxe a destruição das lavouras e dos rebanhos, além de perdas humanas. Na página 5, do Álbum Histórico do Seminário Episcopal do Ceará, lemos o seguinte: “Tanta calamidade levou (Dom Luiz) a fazer, em nome da Diocese, o voto de edificar um templo ao Sagrado Coração de Jesus e de consagrar-Lhe o seu rebanho. Radiante de cumprir esse voto, Dom Luiz, a 15 de setembro de 1878, celebrou o ato de consagração do Ceará ao Coração de Jesus, entre imensa multidão de fiéis, que nesse dia concorreu e participou da Sagrada Comunhão".
Os Evangelhos e a tradição católica mostram as riquezas insondáveis do coração de Cristo, nas suas atitudes de perdão e de misericórdia, para com os povos e terras que lhe são consagrados. O Ceará é prova disso! Ao longo dos últimos 130 anos nosso Estado recebeu imensas graças desse Coração Amoroso. Aqui, as vocações religiosas foram (e continuam sendo) abundantes. O Ceará progrediu materialmente. O povo cearense não conheceu a guerra, nem a fome generalizada, nem grandes catástrofes da natureza, como aconteceu com outros povos. Mesmo o fenômeno da seca, velho conhecido do cearense, tem sido mais brando, de 1878 para cá. Não se repetiram calamidades iguais a de 1877, que passou à história tanto pelo rastro de destruição, com elevado número de perdas humanas e materiais, o que fez o imperador Dom Pedro II declarar: "Venda-se a última pedra da minha coroa, mas não morra nenhum nordestino de fome".

Bispos chegam a Juazeiro do Norte


Entre os bispos que participarão da festa de oficialização da Basílica Menor de Nossa Senhora das Dores, já se encontra no Cariri o bispo da Diocese de Parnaíba (Piauí), Dom Alfredo Scháffler. Ontem ele concelebrou com Dom Fernando Panico, na abertura do tríduo que marca os festejos da Padroeira de Juazeiro do Norte.

Nascido na Áustria, Dom Alfredo Scháffer foi ordenado sacerdote no dia 16 de junho de 1968 na cidade e Diocese de Oeiras (PI). Inicialmente foi vigário cooperador em Oeiras e coordenador de Pastoral. Em 1970 assumiu inicialmente como vigário paroquial em Picos (PI) e posteriormente como pároco a paróquia de Nossa Senhora dos Remédios na cidade de Picos até 1984. Neste ano transferiu-se para Teresina assumindo como Juiz Presidente o Tribunal Regional Nordeste IV. Em Teresina foi pároco na paróquia de Cristo Rei e Vigário Episcopal para a Administração da Arquidiocese. Em 15 de março de 2000 foi nomeado Bispo Coadjutor de Parnaíba. Em 21 de fevereiro de 2001 assumiu o governa da Diocese de Parnaíba. O seu lema episcopal é : Firme na fé

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

O UDENISMO E A CONTA MÉDICA

Existem polêmicas que, por critérios pessoais, desistimos. As vezes revela-se o que se pensa e se dar por satisfeito, até porque o assunto tomou outro rumo. No entanto, refletindo mais, tem dois assuntos, um derivado do primeiro que gostaria de abordar. O primeiro é uma postagem de Valdetário Siebra sobre a história de uma criança em situação de risco na cidade do Recife. Fiz um breve comentário sobre a necessidade de se trazer para o universo político (a polis aquele que por vezes as pessoas saltam da sua individualidade para uma pluralidade transformadora) a questão da pobreza e da fome das crianças no Brasil. Mas não foi nesse o sentido que os demais comentários vieram. Migraram para o ceticismo em relação ao relato do médico e para uma ácida crítica a uma certa "inconsciência social" dos médicos e a voracidade por ganhar dinheiro. A segunda foi, em resposta a este enfoque, de que havia por trás disso um certo "udenismo" nos comentários. Aí passamos à postagem em defesa do udenismo tendo como tese a listagem das pessoas de bem que praticaram o poder na cidade do Crato por este ideário político.

Pelo fim. O "udenismo" é uma categoria histórica reconhecida pela literatura, dicionarizada como os filiados ao antigo partido da UDN e até mesmo faz parte de uma categoria ideológico política. Como categoria histórica o udenismo se criou como uma forte oposição ao governo Getúlio Vargas, combateu este político até a sua morte e com certeza, não por medidas exatamente democrática, tentou o golpe contra Getúlio e depois contra Juscelino Kubitscek. A liderança de um político de renome dos quadros da UDN, Carlos Lacerda, junto com militares da Aeronáutica (o ícone da Aeronáutica, Brigadeiro Eduardo Gomes fora derrotado por Getúlio) esteve por trás das pressões políticas que levaram ao suicídio de Getúlio. Do ponto de vista ideológico o udenismo era uma mistura de defesa das classes médias com a defesa dos grandes proprietários de terra. Por isso mesmo que pendulavam, por vezes, suas posições. Foram a favor do monopólio do petróleo e votaram contra a cassação dos comunistas, mas ao mesmo tempo eram contra a intervenção do Estado na economia, denunciavam a infiltração comunista e contestavam os resultados eleitorais quando perdiam eleições. Perderam as eleições para a presidência nos anos de 1945, 1950 e 1955, ganharam com Jânio Quadros e apoiaram o Golpe Militar de 1964.

Sendo o udenismo uma colcha ideológica, dada a diferença da raiz social do partido, nas suas teses políticas coexistiam ideais liberais, autoritários, progressistas e conservadores. O estilo de fazer política do udenismo era exuberante, denuncista, apegado ao liberalismo, ao bacharelismo, ao moralismo e um horror quase patológico aos chamados "populismos". O interessante é que a UDN na sua representação no Congresso Nacional tinha maior representação de proprietários de terra e funcionários públicos que qualquer outro partido, inclusive o PSD. A UDN sempre foi aliada dos empresários nacionais associados aos capitais estrangeiros e até por isso e em razão da guerra fria era adesista contumaz dos EUA. No embate político daquela época os inimigos da UDN a classificava como o "partido dos golpistas", "partido dos cartolas" e o seus aliados como o "partido do lenço branco" e "partido da aliança liberal". A UDN nunca foi apegada a determinadas formas de governo, especialmente a do voto secreto, como uma instituição essencialmente moralista já abria seu programa com a frase: "de nada valem as formas de governo, se é má a qualidade dos homens que nos governam".

Em síntese o Udenismo evoluiu historicamente numa radicalização já entranhada no seu ideário e nas suas práticas. A primeira fase do udenismo é essencialmente antigetulista e contra a política social e a intervenção do Estado na economia. A segunda fase é essencialmente moralista, combatia a corrupção do governo da aliança PSD-PTB. A terceira fase é a do anticomunismo radical que se aproxima de Adhemar de Barros e protagoniza o golpe de 64 com a deposição de João Goulart.

Agora, todos nós, sem exceção, vejamos que este mesmo ideário, com um certo ajuste histórico se encontra presente na realidade contemporânea. Por outro lado não podemos deixar de prestar a atenção que este ideário se adere precisamente na intimidade de todas as localidades. Especialmente o Crato que teve uma tradição política extremamente conservadora e udenista. Isso sem contar que as lideranças do velho clero do Crato migraram remotamente do integralismo para um udenismo de resultado junto às famílias que dominavam a região.

Quanto à questão da conta médica. Em primeiro lugar para se aceitar a ordem econômica vigente é preciso que toda pessoa de boa fé critique-a em sua raiz, pois desejar que os médicos virem sacerdotes, quando nem isso é realidade no seio das igrejas, especialmente as neo-pentecostais, é um exercício de mero desabafo. Ele, por mais sincero e contundente que seja, não mexe nem uma palha numa ordem cuja matriz é o lucro e o progresso material desbragado. Querer a ordem capitalista para seu progresso pessoal e criticar os médico por tal, é meia crítica e como não existe meia crítica, não se vê crítica alguma. Mas é claro, existem as críticas pessoais e estas apesar de provincianas vigem até na cultural mundial da imprensa americana.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Perigo


A botânica Aline Braga, em tese de doutorado apresentada à Universidade Católica de Brasília, estima que os ipês roxo e amarelo desaparecerão em 50 anos, a continuar o desmatamento descontrolado. Lute, faça sua parte, não prive nossos descendentes dessa beleza que desfrutamos.
Saiba mais na revista Istoé, edição de 10/09/08.
O IPÊ
O
Ipê é a árvore mais conhecida em todo o Brasil, existem cerca de 20 espécies de pequeno, médio e grande porte, exuberantes pela floração: amarela, roxa, rosa ou branca. O ipê roxo fornece madeira de primeira qualidade, muito dura e de grande durabilidade, usada em marcenaria, assoalhos e obras que exigem resistência mecânica. Os ipês são árvores exuberantes e imponentes pela bela floração e pela qualidade da madeira, porém são de crescimento lento e se forem pouco cultivados, como a madeira não vem de reflorestamentos comerciais é proveniente de floresta nativas, ou seja, significa que um dia talvez o veremos apenas no museu ou coleções botânicas... mas, com a conscientização em grande escala, poderemos reflorestar com ipês e ter madeira cuidando do meio ambiente.

Notas da Semana


Embaixador do Papa chega ao Cariri
Pela segunda vez na sua existência, a Diocese de Crato vai receber a visita do Núncio Apostólico no Brasil. Dom Lorenzo Baldisseri (foto), desembarca no Cariri – neste final de semana – para participar da solenidade de instalação da Basílica Menor de Nossa Senhora das Dores, em Juazeiro do Norte, na próxima 2ª feira. O outro Núncio que esteve aqui foi Dom Carmine Rocco, que veio em 1989, quando o bispo era Dom Vicente Matos. Ele veio participar das solenidades de 75 anos de criação da Diocese de Crato.

Saiba mais sobre a Basílica caririense
Basílica menor é um título honorífico concedido pelo Papa a igrejas de diversos países do mundo consideradas importantes por diversos motivos tais como: veneração que lhe devotam os cristãos, transcendência histórica e beleza artística de sua arquitetura e decoração. Entre os argumentos apresentados por Dom Fernando Panico, junto ao Vaticano, para obtenção do título de Basílica Menor para a igreja caririense está o fato de Juazeiro do Norte se constituir num dos maiores centros de romaria da América Latina. Essas romarias são motivadas pela herança espiritual do Padre Cícero Romão Batista, constituindo-se em notícias periódicas nas principais redes de televisão, além de matérias divulgadas pelos principais jornais e revistas do Brasil. Cerca de dois milhões de fiéis visitam anualmente a cidade de Juazeiro do Norte.

História da nova Basílica
A nova Basílica Menor de Nossa Senhora das Dores de Juazeiro do Norte teve origem com a construção, pelo Brigadeiro Leandro Bezerra Monteiro, de uma humilde capelinha cuja pedra fundamental foi lançada em 15 de setembro de 1827. À época, a atual e pujante cidade de Juazeiro do Norte não passava de uma fazenda, situada no município de Crato, propriedade do citado Brigadeiro, denominada de Fazenda Tabuleiro Grande.

Antes tarde do que nunca
O chefe da APA Araripe, Prof. Jackson Antero, adverte que não dá para esperar. A Chapada possui 344 fontes na sua encosta, das quais 294 estão do Ceará. Segundo Jackson, “estas fontes precisam de proteção para não ser extintas”. Ao fazer este comentário, o chefe da APA Araripe prometeu arrancar os canos da nascente da Batateiras, a partir da próxima semana. A única novidade é a presença de guardas municipais na área da nascente para manter a fiscalização do local. Os guardas controlam a freqüência de desocupados na área que estavam tomando banho no tanque de distribuição da água e fazendo desordens, além de impedir a colocação de novos canos na nascente.O guarda municipal Cícero Roberto Coelho diz que é um absurdo ver um manancial ser utilizado por uma minoria, enquanto que o povo pobre, que mora no
é da serra, não tem direito a água para beber.(fonte:www.geoparkararipe.blogspot.com)

Crato export
Francisco Fábio Amorim – conhecido por Ligeirinho – está produzindo sacrários de madeira que estão sendo vendidos para outros estados do Brasil. “Ligeirinho” mantém sua oficina, na Rua Ratisbona, em Crato, onde produz outras peças sacras, como altares. São de sua autoria os altares de madeiras existentes nas igrejas de Assaré, Farias Brito e São Vicente Ferrer, em Crato.

Juazeiro em enciclopédia
A Editora Vértice Ltda. e o Lions Clube de Juazeiro do Norte lançam nesta 6ª feira, dia 12, na Associação Comercial daquela cidade, a Enciclopédia dos Municípios, em livro eletrônico, que tem um capítulo especial sobre a Terra do Padre Cícero. A Enciclopédia foi organizada pelo jornalista e empresário Aldemir Sobreira.

domingo, 7 de setembro de 2008

Leia abaixo o editorial do jornal O POVO deste domingo


Legado da Monarquia

Quase duzentos anos depois da Independência é preciso reconhecer a contribuição da Monarquia ao regime democrático brasileiro

O aniversário dos 186 anos da Independência encontra o Brasil mais esperançoso quanto ao seu futuro. Não só a economia está crescendo - embora ainda aquém do desejado -, mas o anúncio da descoberta do petróleo do pré-sal renova auto-estima dos brasileiros. Trata-se da vigésima comemoração da Independência dentro dos marcos constitucionais democráticos, desde a promulgação da Constituição de 1988. Isso significa que vivemos o mais longo período de democracia contínua de nossa história republicana. No Império, é verdade, também vivemos 67 anos sob regime constitucional democrático, com as limitações vigentes do Estado Liberal. Quando um golpe de Estado derrubou a Monarquia Constitucional Parlamentarista, só os que estavam com mais de 50 anos de idade tinham lembrança de alguma intervenção militar na vida do País.
Durante todo o reinado de Dom Pedro II, vivêramos um regime de liberdades democráticas - só comparável, no continente, à República estadunidense (ambos tinham também o mesmo defeito: o regime escravista comum). Havia ampla liberdade de imprensa, revezamento no poder de dois partidos respeitáveis - o Liberal e o Conservador - e o País era respeitado, internacionalmente, graças, principalmente, à fama intelectual de seu imperador. Aliás, a transferência da família real portuguesa para cá - cuja chegada (200 anos atrás) está sendo comemorada - representou o lançamento dos fundamentos que permitiram a autonomia nacional, menos de uma década e meia, depois.
Mais: o Brasil surgiu como nação sob a égide da revolução liberal, na Europa, que punha fim às monarquias absolutas. Dom Pedro I encarnou as contradições da época: ora se apresentando na pele de autocrata, ora se distinguindo como um filho dos novos tempos liberais. De qualquer maneira, foi graças à opção pela forma de governo monarquista que foi possível manter a integridade territorial do país. Por falta desse centro visível de unidade (representado pelo monarca local) a América espanhola fragmentou-se em vários pequenos países autônomos (quando dos movimentos independentistas). Infelizmente, quase todos regidos, a partir daí, por ditaduras caudilhistas presidencialistas.
O Brasil, no entanto, escolheu o modelo institucional inglês, adotando o sistema de governo parlamentarista (na verdade, semi-parlamentarista, pois havia o Poder Moderador, exercido pelo Imperador). Mesmo assim, criou um regime de mais liberdades do que o da maioria dos países vizinhos. Assim, nesta data da Independência, é um ato de justiça reconhecer essa contribuição da Monarquia ao Brasil, pois, no regime republicano que se seguiu, a democracia só funcionou plenamente em breves interregnos entre uma ditadura e outra.
(Editorial de "O Povo", 7 de setembro de 2008)

POLÍTICA NÃO É CRENÇA

Uma sociedade revolucionária e uma outra conservadora. Ambas intervêm na reprodução humana então existente. Ambas com impacto demográfico. Uma, a revolucionária, de natureza explícita, objetivava reduzir a fertilidade e com isso o crescimento populacional. A outra, andou mais por uma plataforma de ordem moral, num ambiente em que o rumo, também, era a redução da reprodução humana.

Na sociedade revolucionária, a China dos anos 60 e 70, através do planejamento nacional e com uma ação direta sobre as famílias foi limitado o número filhos que cada família poderia ter. Os métodos de redução incluíam as pílulas anticoncepcionais então já produzidas em escala, educação sexual, o uso de contraceptivos mecânicos e, claro, o aborto numa escala sem precedente anterior.

Na sociedade conservadora, a dos EUA, havia dois movimentos em choque, mas o ambiente, então, do ponto de vista da cultura da fertilidade já era outro. Os EUA já eram uma sociedade urbana, a dinâmica demográfica totalmente distinta da sociedade rural. As famílias nucleares, não se precisava, nem no campo, de muita mão-de-obra para produzir. Então os métodos anticoncepcionais já eram de escala ampla. Inclusive o aborto.

Quando a China marcha para as cidades numa economia capitalista de controle estatal e nacional, alguns efeitos inesperados surgiram. Um deles na confluência da nova tecnologia da assistência reprodutiva com a tradição cultural. Como o aborto para reduzir a natalidade era parte do seu programa de controle, juntou-se a tradição cultural em que os filhos masculinos eram mais desejados que os femininos com a ultra-sonografia que revela precocemente o sexo do feto e ocorreu um aborto seletivo. Resultado, em certas províncias e regiões existem mais homens que mulheres. Nesta diferença a raiz de conflitos iguais aqueles da história ocidental do Rapto das Sabinas.

Os conservadores que impuseram uma certe hegemonia nos EUA desde os anos 80 e especialmente nos anos do Bush Jr. tentaram abafar a sexualidade do jovem americano com uma espécie de retorno ao puritanismo sexual. Acontece que o casamento, a matriz conservadora da reprodução, especialmente em relação aos jovens era consoante com a sociedade rural. O casamento era quase um valor de terra, a família também o era e a reprodução apenas dentro do matrimônio tinha conexão com isso tudo. A reprodução ocorria nos primeiros anos do jovem adulto. Não agora, nas sociedades urbanas. As famílias desejam menos filhos, a reprodução pode ocorrer com mais idade.

Ao lado da reprodução, a sexualidade humana ultrapassou qualquer referência animal. A humanidade faz sexo muito além da reprodução. O ato sexual é um ato de identidade, de socialização, de prazer, até de conflito, inclusive para reproduzir. A prática sexual, com os modernos meios de anticoncepção, se tornou democrática e ampla e aí surgiram outras questões, especialmente quanto a higiene e saúde pública. Neste contexto é que passou a fazer parte da formação dos adolescentes os conhecimentos e informações sobre a prática sexual e os modos de prevenir problemas de saúde e de reprodução.

Os conservadores dos EUA puseram de ponta cabeça o que menos desejavam. O efeito inesperado de suas políticas de incentivo á abstinência sexual se tornou um cavalo de Tróia. Segundo o último censo americano, uma de cada três adolescentes americanas têm filhos antes dos 20 anos. Mais ainda, estudos comparativos entre os estados que adotaram o programa de incentivo à abstinência sexual com aqueles que não o fizeram, mostram efeito contrário. O programa ao aumentar a desinformação do jovem aparentemente os expôs a maior gravidez e maior risco de doenças sexualmente transmissíveis.

Agora compreendemos o motivo de tanto alarde para a gravidez de Bristol, a adolescente grávida de 17 anos da conservadora governadora do Alasca candidata a vice na chapa McCain. A governadora Sarah Palin, evangélica fervorosa, antifeminista, contra o aborto e o casamento gay, cortou verbas de programas assistenciais para adolescentes grávidas e as transferiu para o programa de abstinência sexual. Como todos no mundo repetem: não funcionou nem para sua filha.


CULTURA

Restauração ganha novo espaço de artes
no Cariri
Restauradora egípcia Gabriela Federico, realizou a recuperação da imagem de Nossa Senhora da Penha, padroeira da cidade do Crato. Ela chegou ao Cariri por meio de um convite do Iphan
(Foto: ANTÔNIO VICELMO)
O local vai funcionar como ateliê para exposição e espaço cultural para os artistas da Região do Cariri
Crato. Foi inaugurada, no Crato, a Casa de Artes “Olhar” que funciona na Praça da Sé. A iniciativa é da restauradora egípcia, descendente de italianos, Maria Gabriela Federico, mais conhecida por “Gabi”, e por um grupo de artistas da localidade. A Casa funciona como ateliê, exposição e espaço cultural para a apresentação de artistas regionais. As salas foram decoradas com quadros de artistas da Região do Cariri. No quintal da casa, foi construído um palco para apresentações artísticas.
Ali funciona, também, um forno para queima de cerâmicas na fabricação de objetos de barro. No mesmo espaço, funciona um bar de apoio aos eventos culturais. Em breve, será implantado um restaurante.No entanto, o projeto é muito mais amplo. De acordo com Gabi, será instalado um núcleo de turismo com o objetivo de treinar profissionais dessa área. Será a primeira casa do gênero da região. A restauradora está trazendo a proposta de um serviço refinado, exclusivo, focado na restauração e comércio de produtos com valores agregados, sejam financeiros ou sentimentais.
“Geralmente, este trabalho era feito aleatoriamente, sem o conhecimento científico”, destaca o historiador Armando Lopes Rafael, lembrando que Gabi veio para o Cariri, em 2006, por indicação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para restaurar a imagem de Nossa Senhora da Penha, padroeira da cidade do Crato.
Em seguida, ela restaurou a imagem de São José, padroeiro de Missão Velha. Em Mauriti, também na região do Cariri, a restauradora trabalhou detalhadamente na escultura de Nossa Senhora da Conceição, que fica no altar principal da Igreja Matriz. Um trabalho de restauração que a impressionou, segundo Armando, foi a imagem de Jesus Cristo crucificado na Catedral da Sé, no Crato. Havia quatro pinturas que escondiam uma obra de aproximadamente 200 anos.
Uma peça valiosa cujos traços lembram o trabalho de Aleijadinho — escultor, entalhador e desenhista mineiro Antônio Francisco Lisboa, considerado o maior expoente do estilo barroco nas Minas Gerais e das artes plásticas no Brasil.
Enquanto retocava imagens, quadros e outros objetos antigos, a egípcia se apaixonava pelo Cariri que, segundo afirma, é uma terra diferente. “Aqui a gente consegue conviver com a modernidade e o medieval. Os grupos folclóricos, os hábitos e costumes do povo nos remetem à antigüidade” diz a restauradora Gabi.Outro ponto que chamou a atenção da restauradora foi a arte caririense, a criatividade e o talento dos artistas regionais. Gabi ressalta também que o caririense é reservado, isto é, retraído, discreto, prudente e cauteloso no relacionamento com as outras pessoas.
Universo próprio
Maria Gabriela Federico nasceu no Cairo, capital do Egito, mas morou durante muito tempo em Roma, a “cidade eterna”. Depois, Gabi deixou o velho mundo, com mestrado em Restauração de Objetos Antigos, para esculpir o seu próprio universo no Brasil. Terminou escolhendo o Cariri, mais precisamente o Crato, para montar a sua oficina de sonho, criatividade e reconstituição do passado para viver o presente. Atualmente, mora na Praça da Sé, onde um dia o frei Carlos Maria de Ferrara, conterrâneo de seus pais, fundou a cidade do Crato, em 1745, construindo a primeira capela que tem como padroeira Nossa Senhora da Penha, restaurada por Gabi.
ANTÔNIO VICELMO, Repórter
HISTÓRIA
1745 é o ano em que Frei Carlos Maria de Ferrara fundou a cidade do Crato, onde construiu a primeira capela que tem como padroeira Nossa Senhora da Penha, restaurada por Gabi
Mais informações:
Casa de Artes Olhar
Praça da Sé, 91
Crato - Ceará
Restauradora Gabriela Federico
(88) 3521.1590