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quinta-feira, 19 de abril de 2012

Carta aos pretensos candidatos à Prefeitura do Crato


Outro olhar para políticas públicas para cultura

Pensar numa “Cidade da Cultura” no Crato pressupõe existirem cidades sem cultura. Logo essa indagação nos faz pensar sobre que conceito de cultura nos referimos e o que essa afirmação provoca no âmbito das discussões das políticas públicas para a cultura.

Podemos afirmar que o termo “Crato: Cidade da Cultura” é uma invenção das elites econômicas e intelectuais conservadoras da década de 50 do século passado, para se contrapor ao crescimento urbano, estético, econômico e social de Juazeiro do Norte, numa disputa que ainda hoje ronda as visões barristas que nos separam e nos atrofiam. Essa afirmação teve a serventia de colocar os cratenses num falso patamar de superioridade cultural e artística.

Apesar de este conceito ter permanecido, ele foi reinventado, negado e hibridizado ao longo dos anos, a partir de concepções diversas e divergentes, mas que comungam com a ideia de defesa do território simbólico e espacial.

A região do Cariri, notadamente as cidades de Crato e Juazeiro do Norte tem uma produção estética e artística efervescente, criativa e misturada em que o tradicional se mescla do contemporâneo, em que o popular e o erudito se hibridam fazendo frente à hegemonia da cultura de massa. Em que a tradição e os novos tradutores da cultura, arte e estética se brindam nos terreiros e nas conexões cibernéticas.

O discurso sobre o “artista da terra” e da “cultura de raiz” deve ser substituído por uma compreensão mais ampla e consistente, que considere os agentes da produção simbólica (artistas), como seres dotados de identidade e história, que dialogam constantemente com o seu umbigo social e o mundo e que não rastejam em terras úmidas, como as minhocas. Mas que são voadores e andarilhos, dóceis e bravos, resistentes e frágeis. Trabalhadores que trocam a sua mão de obra manual/intelectual pela sua subsistência. A produção intelectual e artística não deve ser vista com um hobby ou uma vitrine gratuita de apresentações. Por lado a cultura não é vegetal e por isso não pode ter raízes. A cultura é viva, é dinâmica, se reinventa, se hibrida, criar teias, se modifica constantemente e não se enclausura em padrões fixos ou determinações institucionais.

Essas colocações desapontam as concepções de gestão cultural ou de políticas públicas para a cultura que assinalam como caminhos visões que privilegiem determinadas produções simbólicas em detrimentos de outras perfazendo muitas vezes o percurso ilusório do discurso da “Cidade da Cultura”. Por lado, é inviável pensar que a gestão da cultura é um banco de financiamento público para todos e tudo.

Para pensar a gestão da cultura e das políticas para cultura no Crato se deve considerar as conquistas alcançadas, visando consolidar-las e aprofundar-las para evitar retrocessos e atropelos pelas gestões posteriores.

Outro fator, importante neste aspecto é que o Crato não ficou a margem dos processos de discussões da conjuntura nacional no tocante a políticas públicas para cultura e deu inicio a alguns aspectos jurídicos que devem ser reforçados e tornados triviais para a população e o poder público.
Diante do exposto, apresento algumas questões que são essenciais para refletir sobre as políticas públicas e a gestão da cultura na cidade do Crato. Para facilitar o entendimento se compreende como políticas publicas, ações que tem caráter “permanente” e são amparadas por aspectos jurídicos e gestão da cultura como formas organizacionais de gerir o setor e normalmente tem um caráter efêmero e se modificada de gestor para gestor.

A intenção não é recriar a roda, mas reforçar concepções que vem sendo defendidas pelos diversos agentes da produção simbólica e intelectual do campo progressista no país e que ganhou conteúdo e forma mais encorpada a partir do governo Lula, tendo como referencial dessas concepções figuras como Celio Turino, Juca Ferreira, TT Catalão, Gilberto Gil, Sergio Mamberti, Américo Córdula e Marilena Chaui, dentre outros e que teve como caixa de ressonância e empoderamento os diversos segmentos organizados do povo brasileiro que cotidianamente se reinventam, se pluralizam, se diversificam e se hibridizam, em cada ponto vivo das culturas do Brasil.

Quais são, portanto esses norteadores para se pensar as políticas e a gestão da cultura no Crato?
É preciso ter um norte que não seja fechado, mas que carregue um direcionamento que compreenda a cultura e a produção simbólica como direitos humanos, capaz de possibilitar que as pessoas possam se desenvolver e participar plenamente da vida.

Portanto é imprescindível que as políticas públicas para cultura sejam refletidas de forma intersetorial, pois ela deve ter ligação com o desenvolvimento econômico, social, educacional, turístico, comunitário, agrário e desportivo da cidade e da população.

Outra questão fundamental é garantir a acessibilidade da população as diversidades de linguagens estéticas e artísticas e as manifestações culturais de caráter tradicional e contemporâneo visando o entrelaçamento do popular e do erudito, do regional e do universal, sem hierarquias ou segmentações.

O patrimônio histórico, cultural, arquitetônico e artístico da cidade deve se tornar patrimônio vivo da população, o que só possível com a interação e processos educativos baseados em relações de identidade e pertencimento.

É necessário criar mecanismos de consulta permanente com os diversos segmentos para vislumbrar e efetivar políticas públicas, bem como possibilitar a criação de uma rede formada a partir do reconhecimento dos trabalhos de grupos e artistas nas comunidades rurais e urbanas como elemento de potencializar a troca de saberes e fazeres e o empoderamento político dos agentes culturais numa tentativa de redescobrir a produção simbólica do nosso povo.

Outra questão fundamental é agilizar o funcionamento do Fundo Municipal de Cultura e uma política de edital que incentive a produção artística de forma desburocratizada.

Criação de uma política de ocupação dos equipamentos culturais de forma permanente e adequação das necessidades técnicas.

Continuidade e consolidação dos eventos que vem sendo desenvolvido no Município pelo Poder Público Municipal, em especial o Festival Cariri da Canção, Abril prá Juventude e o Festival de Quadrilhas Juninas e incentivo aos demais eventos que já fazem parte do calendário turístico da cidade.

Revisão, discussão e aplicabilidade das resoluções da Conferência Municipal da Cultura.

Reconhecer as escolas como centros privilegiados de fruição e disseminação da cultura, da estética e das artes no sentido de transformar/adaptar esses equipamentos em espaços vivos de estudos, vivências, experimentações e circulação dos saberes e fazeres tradicionais e contemporâneos, regionais e universais, eruditos e populares. É primordial que as escolas possam atender as determinações da resolução estadual 411/2006 que fixa normas para o componente curricular Artes, no âmbito do Sistema de Ensino do Estado do Ceará, que vem sendo severamente descumprido pelo Governo Estadual e pelos Governos Municipais.

Esse é um ensaio para esboçar uma perspectiva mais abrangente que possa perpassar gestões e entregar ao povo o legitimo direito de protagonizar suas escolhas estéticas, artísticas e culturais de forma ativa e permanente.



Alexandre Lucas
Coordenador do Coletivo Camaradas, integrante do Coletivo Nacional Programa de Interferência Ambiental – PIA, pedagogo e artista/educador.