Seja colaborador do Cariri Agora

CaririAgora! é o seu espaço para intervir livremente sobre a imensidão de nosso Cariri. Sem fronteiras, sem censuras e sem firulas. Este blog é dedicado a todas as idades e opiniões. Seus textos, matérias, sugestões de pauta e opiniões serão muito bem vindos. Fale conosco: agoracariri@gmail.com

terça-feira, 21 de outubro de 2008

A BÚSSULA DA VIDA NO COTIDIANO DO RIO DE JANEIRO

Quatro pontos cardeais no espaço compreendido entre o Passeio Público e a Cinelândia.

A oeste, no quadrilátero compreendido pela Escola de Música da UFRJ, a Sala Cecília Meirelles, a Igreja da Lapa e o Muro do Passeio Público. Nele um mulato magro, com o tronco nu, calças encardidas e arregaças, um violão, um microfone e a caixa de som. Neste ponto cardeal a voz amplificada e as batidas metálicas das cordas reboam como as nuvens atômicas no largo limitado pelos Arcos da Lapa e sobem ao éter em busca do Alto de Santa Teresa.

A leste do Passeio, no largo para a Praça Manhatma Gandhi e o Hotel Serrador, de vista para a Senador Dantas. Um negro, com feições de indiano, tranças rastafári, boné, camisa preta e calças cinza, um par de tênis e uma trouxa ao lado. Ora sentado na borda estreita do muro do Passeio ou sobre o respiradouro da garagem subterrânea. O mais absoluto silêncio, uma contemplação de paisagem, mas ao mesmo tempo para o necessário espaço da fórmula com a qual estamos no mundo. Nunca os meus olhos encontraram os dele. Não observa ninguém. Todos os dias é o ponto cardeal do Centro do Rio de Janeiro. Como se alimenta e onde dorme a eterna pergunta do transeunte que ao seu lado passa, também com olhar de paisagem.

Ao norte da Cinelândia, bem em frente à Biblioteca Nacional de um lado e do outro o Bar Amarelinho, sentido oposto o Teatro Municipal e ao sul a silhueta do Pão de Açúcar. Sobre a grade do respiradouro do Metrô, onde os ventos do deslocamento das composições sopram, o terceiro ponto cardeal desta nossa vida disforme. Uma mulher magra, vestida em trapos sobrepostos, lenço na cabeça, negra, jovem e seu olhar esbugalhado para um ponto fixo defronte de si. Sentada sobre a grade do suspiro dos vagões que engolem e vomitam gente, ela eternamente dobra o tronco sobre as pernas num vai e vem, num sobe e desce como se fosse o pistão de uma máquina a vapor.

O quarto ponto, aquele que deveria dar sentido a esta desgraçada Rosa dos Ventos, se forma pelo vazio no qual foi um dia o Prédio do Senado Federal e o majestoso e branco edifício da Câmara dos Vereadores. Nesta planície a pluralidade que a sociedade é se torna o nada em razão dos demais pontos cardeais. Seja este um espaço amplo do burgo ou tal uma maquinaria de tempo a realizar. Afinal o espaço é um pântano e o tempo não maquinou nada. Continua como há mais de século, entre o espaço da senzala e o chicote no lombo do escravo.

Nenhum comentário: