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terça-feira, 28 de julho de 2009

Raízes históricas da rivalidade entre Crato e Juazeiro

Por Carlos Rafael Dias*

Os antagonismos entre as duas principais cidades caririenses parecem ter no processo de emancipação política de Juazeiro e na Sedição de 1914 os seus momentos de maior tensão. Isso sem ignorar a posição contrária do clero cratense aos supostos milagres de Juazeiro, um antecedente que veio a fermentar esta rivalidade. Da mesma forma, deve se considerar, como um importante fator dessa tradicional rivalidade, a ascensão econômica de Juazeiro, já no início do século xx, fruto das crescentes romarias. Por sinal, este foi o argumento das lideranças juazeirenses para motivar a campanha pela autonomia daquele que na época era um mero distrito do Crato. No entanto, a maior motivação pró-emancipacionista foi a insatisfação decorrente dos impostos cobrados, em benefício do Crato, sobre as receitas do comércio de Juazeiro.

Se havia toda uma matéria-prima pré-fermentada para o confronto, faltava quem se dispusesse a instigar a massa para a causa emancipacionista. Esse papel foi exercido pelos editores do jornal O Rebate, semanário que circulou entre julho de 1909 e agosto de 1911. O principal objetivo do órgão era divulgar a causa Juazeirense contra as acusações desferidas pela imprensa do Crato que qualificava o Juazeiro como antro de fanatismo e banditismo. Como um desdobramento da propaganda anticratense, a população, mobilizada, boicotou o pagamento de impostos recolhidos ao Crato.

Juazeiro foi elevado a município em 4 de outubro de 1911, quando Padre Cícero foi empossado como prefeito, fato que o iniciou oficialmente na vida política. Neste mesmo dia, foi assinado em Juazeiro o famoso Pacto dos Coronéis, uma tentativa de pacificar a região, bastante tumultuada pelas violentas deposições de coronéis por outros coronéis, com uso de milícias particulares formadas, notadamente, por jagunços e capangas.

No final de 1913, um senador cearense enviou, através do então deputado federal Floro Bartolomeu, uma carta ao Padre Cícero onde era tramada a deposição do coronel Marcos Rabelo, eleito presidente do Estado do Ceará ao derrotar o grupo do oligarca Nogueira Acióli, que governou com mão de ferro a província por longo tempo. Um ano antes, Padre Cícero tinha iniciada uma longa troca de telegramas com Franco Rabelo. Nos primeiros contatos, Padre Cícero refutava a informação de que ele estaria preparando um levante contra o governo do Estado. A denúncia, que o padre considerava uma intriga de políticos adversários, poderia resultar numa intervenção armada em Juazeiro por parte do governo estadual.

A sedição para depor Franco Rabelo irrompeu, como assim já se anunciava, no dia 8 de dezembro de 1913, com o desarmamento, em Juazeiro, de um destacamento da polícia do Estado que teria a incumbência de prender ou matar Floro Bartolomeu. No dia seguinte, vários políticos juazeirenses, como o prefeito João Bezerra de Menezes, sucessor do Padre Cícero, refugiaram-se no Crato. E o Crato virou alvo da milícia que Floro Bartolomeu recrutou entre famosos e temidos celerados vindos de várias partes do Nordeste.

Os cratenses, logicamente, sentiram-se ofendidos com a invasão. Testemunhos dão conta que os sediciosos, sob o comando de Floro Bartolomeu, teriam invadidos e saqueados residências e estabelecimentos comerciais, mesmo contrariando a ordem do Padre Cícero de que não houvesse violência e que deixassem livres algumas estradas que permitissem a fuga daqueles que não quisessem lutar.

Esses episódios conjugados são os principais vetores da rivalidade que vez por outra é requentada, principalmente, na ocorrência de polêmicas que envolvem a destinação de investimentos públicos dos governos federal e estadual para a região. Quando os grandes investimentos são alocados em benefício do Juazeiro, os cratenses se queixam da intervenção de um “conciliábulo do mal” formado pelos adversários da cidade.

Há quem diagnostique que toda essa problemática deriva de duas doenças adquiridas e que teimam parecer congênitas. Enquanto os cratenses são vítimas de uma letal “juazeirite”, os juazeirenses foram acometidos de uma incurável “cratite”. O mal é, pois, intrínseco ao antídoto: rivalidade só se cura com união de interesses que venham igualmente beneficiar as populações das duas cidades. Sem inveja, sem mesquinhez, sem retrocesso.

Um remédio? A recém-criada Região Metropolitana do Cariri, que deve ser prescrita sem contra-indicações, apesar dos possíveis efeitos colaterais que podem causar em pessoas de espírito bairrista.

* Professor do Departamento de História da Universidade Regional do Cariri – URCA.

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