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sábado, 30 de janeiro de 2010

A farsa da romaria e as chamas do Caldeirão


Por Alexandre Lucas*



A experiência do Caldeirão baseada na partilha da produção e na religiosidade popular merece o resgate histórico sem a maquiagem das elites e da Igreja Católica.
As vésperas de completar 73 anos do massacre ocorrido na sitio Caldeirão no Crato pelo Exército e pelo Policia Militar do Ceará, com o apoio das elites e da Diocese. Pouco se sabe sobre a história e as atrocidades cometidas contra homens, mulheres, crianças e idosos que almejavam desfrutar da terra que um dia inventaram de cercar.

O Caldeirão foi um exemplo de utopia possível. Em poucos anos cresceu a população da comunidade, chegando a cerca de dois mil habitantes. Camponeses advindos de diversas localidades e fugindo da exploração latifundiária acreditavam que a comunidade do Caldeirão era terra da prosperidade.

Uma comunidade auto-sustentável na qual seguia a lógica socialista de produção social e apropriação coletiva, ou seja, tudo que era produzido passava pela divisão.

Uma terra “emprestada” pelo Padre Cícero, ao Beato José Lourenço e a sua comunidade serviu do pão de esperança e fraternidade, mas após morte do padim, a terra foi requerida pelo uso da força e a pedidos dos salesianos. Vale destacar que quase todos os bens do Padre Cícero foram doados em testamento para Congregação dos Salesianos.

Qual a ameaça que essa comunidade representava para a Igreja Católica e para os latifundiários? A quem interessava a destruição sangrenta destes camponeses? É bem verdade que a história nos aponta algumas pistas, uma delas é a ameaça a propriedade privada. Em Canudos ou na Guerrilha do Araguaia o massacre ocorreu em defesa dos poderosos, sejam eles, os donos das terras e das fabricas ou dos comerciantes da fé.

A revitalização do Caldeirão proposta pelo Governo do Estado em parceria com o Governo Municipal do Crato deve passar pelo resgate histórico e pela garantia de sustentabilidade e da melhoria das condições de vida da população do local, o que deve inclui a valorosa experiência de resistência dos camponeses do Assentamento 10 de Abril e a historiografia dos índios Kariri que residem nas terras próximas ao Caldeirão e que tem histórias semelhantes, a idéia de poder cultivar e manter o meio ambiente como forma de sobrevivência e comunhão.

O povo brasileiro tem o direito a memória e a verdade dos fatos. Neste sentido é preciso não camuflar, nem permitir a hipocrisia como lençol da história. A verdade não pode ser apagada em romarias, como vem ocorrendo nos últimos anos. É preciso fazer uma leitura crítica, pois ainda podemos escutar os gritos dos cristãos que morreram inocentemente por fazerem do discurso uma pratica.

Pela abertura irrestrita de todos os arquivos do Caldeirão e pelo direito a verdade dos fatos!
*Coordenador do Coletivo Camaradas, pedagogo e artista/educador

Um comentário:

Zé NIlton disse...

Meu caro Alexandre.
A História tem disso, ser possível de zis interpretações.
Você escreveu, como sempre indignado, uma qualidade de quem não compactua com as coisas desse mundo real, sobre o Caldeirão.
Mas, olha, não convém à luz da época e da história, jogar a questão da devassa do Caldeirão a uma só ou duas instituições da organização social daquele tempo. A questão era bem maior.
Todos os movimentos sociais, desde a Confederação dos Cariris, as Sabinadas, as Balaiadas, a Conjuração Bahiana e a mineira etc. etc. etc. são movimentos contra a ordem da dominação.
O nome dessa ordem é o capital e sua força para fazer valer a sua reprodução.
Veja, o Caldeirão ocorre em plena modernização do estado brasileiro, modernização esta patrocinada pelo capital interno, diga-se de passagem, mas se atrelando ao capital internacional. É só rever as posíções de Vargas...
O Caldeirão assim como Lampião e outros movimentos desta parte nordestina, tiveram o mesmo tratamento do caso de Canudos: extirpação de uma possível ameaça à recepção da capitalismo "tardio" em nosso meio.
Como você sabe, muito bem, por ser um comunista ilustrado, não seria de bom alvitre jogar para cima da Igreja nem da oligarquia rural a derrocada do Caldeirão.
O problema é mais em cima.
É só lembrar do velho Marx e a sua sacada da interdependencia dos ditames da infra-estrutura econômica e da superestrutura social. Na época do Caldeirão quem eram os defensores do statuo quo vigente ? Só a Igreja, só os latifundiários, como você diz ?(Aliás, no Cariri é o minifúndio que prevalece a partir da primeira metadeo século XX). NÃO ! É o conjunto das forças hegemônicas sob o capital, captanedas pelo Estado Brasileiro, que por sua vez estava subsumido à ordem do capitalismo internacional em expansão, liderando as modernizações conservadoras nos países pobres.
Veja, não sou marxista. Sou Antropólogo, com direito a entender das coisas do mundo.
E aqui não vai nenhuma reprovação as suas idéias sobre o Caldeirão. Quis apenas contribuir para o alargamento do debate, coisa muito cara a todos nós das ciências sociais.
Um abraço
Zé Nilton