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segunda-feira, 21 de junho de 2010

Torcendo com o Inimigo – por Carlos Eduardo Esmeraldo

Futebol sempre desperta paixões. Desde 1958, quando o Brasil conquistou sua primeira Copa do Mundo, eu comecei a me interessar por esse esporte. A partir daí, acompanhava os jogos do Rio, São Paulo e Bahia pelas rádios. E imaginava o futebol deles como uma coisa irreal, sobrenatural até, bem diferente do que eu costumava ver no nosso campo do Esporte, na Rua Carolina Sucupira. Até os lances exibidos pelo Canal 100 no Cine-Moderno e Cassino nos davam a impressão de algo extraordinário.

Em 1964, em Salvador, o Ceará foi jogar contra o Bahia. Eu e meus primos resolvemos ir ao estádio e torcer pelo Ceará. Era a primeira vez que eu iria ver um jogo de futebol num grande estádio. A Fonte Nova me impressionou. Por fora se via apenas um muro bastante alto. Mas quando entramos, verificamos que estávamos na encosta de um alto e o campo de jogo era em baixo, circundado por uma enorme escadaria em forma de ferradura. Escolhemos um lugar onde havia sombra. Era no meio da torcida do Bahia. Quando nosso grupo se acomodou, imediatamente ouvimos um torcedor baiano gritar: “Esses bichos aí têm caras de cearenses e vão sair daqui debaixo de porrada.” Então um dos primos acalmou os baianos, dizendo que também torcíamos pelo Bahia e que não éramos cearenses coisa nenhuma. Uns dez minutos depois de iniciado o jogo, o Ceará já perdia por dois a zero, e com o coração dilacerado, tivemos de pular a cada gol dos baianos. Para mim, aquele jogo foi decepcionante. Não via nada diferente do joguinho que o nosso Anduiá, Enoque, Bebeto e Doce de Leite faziam pela seleção do Crato no campo do Esporte.

As nossas ações no meio da torcida baiana foram muito divertidas, apesar de sofridas. No segundo tempo, o Ceará voltou bem melhor e dominava claramente o jogo. Eu estava ao lado de um baiano e lhe disse: “O nosso time está muito acovardado, acho que eu vou torcer pelo Ceará!” “E eu também!” Respondeu o baiano, sem muita convicção. Nesse momento, Gildo marca um belo gol para o Ceará. Um dos primos pulou para comemorar, quando eu o puxei pelo braço sufocando o seu grito de “gôôôôl... que começava a dar. Então, ele se lembrou de onde estava e das promessas dos baianos. Depois da minha advertência, balançou os braços para o alto, em sinal de protesto e lavando a alma soltou um sonoro palavrão que substituiu o grito de “gôôô... para o pôôôô....a.”

Depois dessa, esperei nunca mais ir ver jogo no meio das torcidas adversárias. Mas passados quinze anos, eu e Magali chegamos ao Rio de Janeiro, num sábado à noite. Na recepção do hotel, um carioca muito animado, nos disse: “Amanhã tem Flamengo e Vasco no Maracanã. Se quiserem ir, temos os ingressos e ônibus na porta do hotel”. Recusei, pois gostaria de passar a manhã visitando os pontos turísticos do Rio. Fomos ao Maracanã num taxi e chegamos quase na hora do jogo, compramos ingresso para as cadeiras. Não havia mais nenhum lugar disponível. Ficamos nos degraus, onde já havia muita gente acomodada. Na cadeira ao lado, um senhor, educadamente, cedeu seu lugar a Magali e, sentou-se no cimento da escadaria ao meu lado. Era um torcedor do Flamengo. No meu imaginário de vascaíno, jamais poderia esperar uma atitude tão educada quanto aquela partindo de um torcedor do “urubu”. Olhei ao redor e só via torcedores com a camisa rubro-negra. Época do Zico, e um monte de estrelas que faziam do Flamengo um time invencível. Com poucos minutos de jogo, o Flamengo fez três gols e eu sofria com a derrota do meu Vasco, abraçando o amigo flamenguista, a cada gol. Era uma espinhada muito profunda no meu coração vascaíno. No segundo tempo, ocorreu o mesmo daquele jogo da Bahia. O Vasco começou a reagir, fez um e dois gols e estava já para empatar, quando o Flamengo fez o quarto gol. Eu fazia tudo para não desgostar aquele novo amigo carioca e flamenguista. Quando o jogo terminou, eu o abracei e agradeci. E ele, muito brincalhão, como todo carioca, disse: “É, mas eu notei que você é vascaíno. Se eu tivesse adivinhado antes, não teria dado meu lugar à sua mulher.”

Por Carlos Eduardo Esmeraldo

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