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domingo, 14 de novembro de 2010

A República - José do Vale Pinheiro Feitosa

A monarquia sofre abalos desde o sistema de produção industrial e o fim da terra agropastoril como valor essencial. E emergência dos trabalhadores fora do campo, implicando rapidamente no fim da família, praticamente destruiu um dos esteios fundamentais do poder monárquico. Sem o poder patriarcal ou matriarcal a monarquia perde sentido e se transforma numa poliarquia. Em outras palavras o governo de muitos, que “reside numa coletividade ampla”.

A institucionalidade da República moderna foi essencialmente revolucionária. Nasceu com o sistema de produção capitalista, com a mobilidade transcontinental de trabalhadores, com o colonialismo e com a Reforma Protestante. Esta última lancetou o centro simbólico da monarquia na Civilização Ocidental: o poder Papal. A própria emergência do Renascimento e das guerras das cidades-estado italianas, já antecipavam o que aconteceria em Reforma logo alguns anos após.

Uma das coisas mais contraditórias na modernidade é um monarquista que reza pela cartilha liberal de Adam Smith. A radicalidade deste pensador inglês é tamanha que nem mesmo a idéia de Deus sobrevive nos moldes bíblicos, embora a bíblia protestante seja muito útil para controlar os trabalhadores, mas não os capitalistas. As revoluções (Inglesa, Americana e Francesa) foram a matriz da moderna poliarquia, tenha ou não nome de República.

Enquanto os Ingleses conquistaram a acumulação capitalista, deixando a terra apenas como símbolo de riqueza e prestígio da “nobreza” e mantendo a integridade das grandes famílias tradicionais que fizeram o império, os Franceses foram mais longe. A revolução Francesa foi profundamente anticlerical ao destruir os enormes feudos sobre domínio do clero, mexeu na estrutura das famílias tradicionais e fizeram a emergência de uma nova gente urbana, os burgueses. Esta última revolução instituiu o poder da burguesia (Napoleão foi fundamental nisso) e se tornou o modelo para toda a história a partir daí.

A Revolução Americana foi, de fato, a fundadora da República Moderna. Os pioneiros foram mais longe que os ingleses e franceses, foram buscar os princípios na Grécia e em Roma. Naquele país foi criado o maior ensaio político, social e econômico, jamais visto para fundar um sistema que estava morto e para os quais não havia referência no novo sistema de produção. Mesmo com as contribuições que podem se aparentar entre o positivismo e outras estruturas de pensamento da burguesia que começava a dominar, sem dúvida nenhuma, foram os EUA que fizeram o experimento da República Moderna.

O Brasil, amanhã, comemorará 121 anos da Proclamação da República. Ao contrário do que se imagina foi um curso não revolucionário de uma revolução que já acontecera praticamente no início do século XIX. As guerras napoleônicas, invadindo a península ibérica estão na matriz do moderno Estado brasileiro: a fundação dele com a transposição da corte portuguesa para as Américas; a Independência, a Constituição de 1824 e depois a própria Monarquia Constitucional.

Numa sociedade de massa, sem o domínio das corporações ou de elites, quando a democracia será mais direta e menos representativa, a República Moderna será superada. Há quem imagine um equilíbrio vivo de todos, com maior igualdade e com a arquitetura do tempo presente e futuro sendo construído pela coletividade ampla. E o indivíduo, onde este estará? Na diversidade atômica da coletividade.

Um comentário:

Zé NIlton disse...

Muito boa a reflexão de Zé do Vale. Na verdade a República ou a República moderna nasce no bojo de um movimento revolucionário que vinha se processando enquanto ideário no seio da burguesia desde os fins do medievo.
Zé do Vale toca nas questões do Renascimento e da Revolução Industrial como panos de fundo da nova forma de governo necessária à quebra do antigo regime, tudo bem.
A nosso ver os movimentos que marcaram os novos tempos têm raízes na razão iluminista que desencanta o mundo, que cria o novo conceito de homem (vide Foucaud), que chama a atenção para o ensejo de uma nova ética para domar o espírito do capitalismo nascente, que sob uma mesma razão propõe dois vieses ideológicos: um instrumental e outro libertário. Enfim, refunda o constructo histórico como sendas por onde os homens contruirão seus destinos. E os homens construíram boas e ruins monarquias e igualmente repúblicas.