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quarta-feira, 28 de maio de 2008

O DESMONTE DA LIRA


Renato Casimiro

Não lhes dou uma boa notícia se lhes asseguro que está em curso mais uma perversa e, talvez, definitiva ação contra a gráfica de literatura de cordel de Juazeiro do Norte, a Lira Nordestina. Ao atravessar diversas estações de sua via crucis, a Lira vem sofrendo enormes perdas, o que a levará, indubitavelmente, por tais manobras, à sua extinção. Os que se envolveram com a sua necessidade premente de existir como núcleo importante de nossa cultura, de algum modo, como os gestores da universidade, após o reitorado do prof. Teodoro, sabem muito bem como isto pode ser atingido facilmente. É algo como ler Maquiavel pelas madrugadas. Estou me propondo, nesse instante, a fazer uma breve reflexão sobre os destinos da Lira, se possível respeitoso e contundente, com o objetivo imediato e, dirão - pretensioso, de fazer alguma coisa que o futuro não me acuse de omissão. A Lira veio da família de José Bernardo da Silva e era uma empresa bem sucedida. Por muitos anos existiu com a fama de ser a maior e mais expressiva gráfica de folhetos deste país. Já não é pouca coisa. O Governo do Estado a comprou e a transferiu para o controle da Academia Brasileira de Cordel (ABC). Depois de algum tempo, mercê das pressões que foram exercidas pela comunidade, a Lira passou ao comando da universidade. No início, boas e auspiciosas ações, dando-lhe localização definitiva e acenando concretamente com algumas coisas fundamentais para a sua indigente sustentabilidade (minguadas verbas de custeio, um salário mínimo para um dos encarregados e algumas e modestas encomendas de folhetos e xilogravuras). Nada disso fazia jus ao papel relevante da Lira, depositária de uma produção de centenas de folhetos, um acervo importantíssimo, vindo de poetas que ainda viveram o século 19. Mesmo assim, a duras penas, a Lira continuou sendo o espaço legítimo da reunião e do trabalho de poetas e xilógrafos, aos montes. Nesses anos, entra administração, sai administração, cada uma ao seu estilo, a Lira figurou no discurso falacioso dos gestores, alguns com pose de intelectuais de ocasião, alguns beirando a mediocridade, pouco sabedores da valia do negócio. A Lira continuou, ainda que modestamente, editando poucos dos seus folhetos e algo mais que vinha dos novos valores e tendências da literatura de cordel na região. Nesse meio tempo, o valor maior da Lira, pela propriedade de clássicos da literatura, sofreu barbaramente com a apropriação indevida de seus títulos, impressos por quem desejou fazê-lo, sem ao menos se perguntar a quem, ou como um deles, que ainda pede licença à ABC. Agora, parece que estamos diante da famosa e derradeira pá de cal. Quem visita a Lira por estes dias vai sair de lá desolado. Nada do que por ali transita na sua administração tem o aval do bom senso. Escolheram, bem a propósito assim nos parece, um gerente que não se cansa de repetir que não gosta de cordel e não gosta de xilogravura. E, como tal, só se revela que está ocupando o local errado, a não ser que esteja definitivamente tomado por esta missão valiosa de interditar e inviabilizar, definitivamente, a Lira Nordestina. Descrente de que seria possível contar com alguma sensibilidade da instituição, mesmo assim conclamo, neste penúltimo sofrimento, a adesão de segmentos que ainda acreditam que a Lira pode continuar existindo para o fomento de parte expressiva de nossa cultura popular, sendo departamento imprescindível para o que a instituição ainda nem ousou iniciar. Mesmo reconhecendo a autonomia desta universidade, não é possível creditar-lhe qualquer confiança diante do que tem sido este testemunho de má vontade, de má fé e de falta de zelo para com um equipamento de tão grande importância. Mas, seguramente, este valor não é sentido pela administração, pois ele toca, especialmente, o nosso orgulho pessoal de gente caririense, por ter uma história rica através destes valores que foram construídos ao longo de muitos anos. Acho que todos entendemos que é da universidade a responsabilidade de inserir a Lira em seus programas de desenvolvimento cultural, muito antes que um sentimento menor a enquadre em duradouras e perniciosas questões paroquiais adormecidas. Como a questão é grave, e não devemos facilitar diante desta perversidade que se deseja perpetrar, apelamos para um gesto elevado da instituição, revelando-nos a sua verdadeira atitude com respeito aos planos de melhorias e a dinamização das suas ações, pois o Cariri ainda será um pouco menor se não puder contar com a Lira Nordestina na afirmação de seu universo cultural.

Artigo publicado na edição de 27 de maio de 2008 (ontem) do Jornal do Cariri.

2 comentários:

José do Vale Pinheiro Feitosa disse...

Renato faz uma excelente análise da decadência da Lira Nordestina como negócio e como instituição cultural do cariri. Mas vai além: levanta a questão de como o Estado (através de sua Universidade) poderia interromper este curso. Pelo que escreve o papel da Universidade não foi e não é suficiente para tal. Onde estaria o problema? Ouso levantar algumas questões para contribuir com a boa ocasião criada pelo Renato.

a) Na verdade não estaria a literatura de cordel como um todo entrando num gueto cultural e perdendo o peso relativo que tinha em relação a outras manifestações?

b) A cadeia de produção, formação de público (divulgação)e leitura não estaria comprometida com a própria modificação do comércio regional, principalmente das feiras que era o grande momento desta cadeia?

c) O perfil da URCA não parece ser o de negócio. Nem a própria unidade de engenharia de produção parece ter uma incubadora de empresas. Isso levanto pois a literaruta de cordel, a par de ser um bem intangivel da cultura regional, como gráfica era um negócio produtivo e comercial.

d) A URCA teria que desenvolver um programa completo de perfil universitário: 1) criação de pós-graduação, na graduação e outras modalidade de ensino da literatura de cordel; 2) criado programas de financiamento de pesquisa em literatura de cordel, sua cadeia cultural e sua subsistência como valor econômico; 3) criado uma atividade de extensão universitária para atrair empreendedores, artesãos e poetas de cordel para o negócio da gráfica e divugação da literatura, aí se usufruindo das pesquisas realizadas. Acrescento que nestas atividades de extensão estariam incluídas a formação de público, principalmente popular, através da busca de financiamento nos órgãos que atuam na região (Centro Cultural do BNB; SESC etc.)














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José do Vale Pinheiro Feitosa disse...

Renato faz uma excelente análise da decadência da Lira Nordestina como negócio e como instituição cultural do cariri. Mas vai além: levanta a questão de como o Estado (através de sua Universidade) poderia interromper este curso. Pelo que escreve o papel da Universidade não foi e não é suficiente para tal. Onde estaria o problema? Ouso levantar algumas questões para contribuir com a boa ocasião criada pelo Renato.

a) Na verdade não estaria a literatura de cordel como um todo entrando num gueto cultural e perdendo o peso relativo que tinha em relação a outras manifestações?

b) A cadeia de produção, formação de público (divulgação)e leitura não estaria comprometida com a própria modificação do comércio regional, principalmente das feiras que era o grande momento desta cadeia?

c) O perfil da URCA não parece ser o de negócio. Nem a própria unidade de engenharia de produção parece ter uma incubadora de empresas. Isso levanto pois a literaruta de cordel, a par de ser um bem intangivel da cultura regional, como gráfica era um negócio produtivo e comercial.

d) A URCA teria que desenvolver um programa completo de perfil universitário: 1) criação de pós-graduação, na graduação e outras modalidade de ensino da literatura de cordel; 2) criado programas de financiamento de pesquisa em literatura de cordel, sua cadeia cultural e sua subsistência como valor econômico; 3) criado uma atividade de extensão universitária para atrair empreendedores, artesãos e poetas de cordel para o negócio da gráfica e divugação da literatura, aí se usufruindo das pesquisas realizadas. Acrescento que nestas atividades de extensão estariam incluídas a formação de público, principalmente popular, através da busca de financiamento nos órgãos que atuam na região (Centro Cultural do BNB; SESC etc.)














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