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domingo, 18 de janeiro de 2009

Documentário tem Lira Nordestina como tema




Juazeiro do Norte. Um celeiro cultural inquestionável. O Cariri é um laboratório para pesquisadores de todo o Brasil. Uma nova modalidade de estudo vem sendo realizada na região por pesquisadores do Núcleo de Experimentação em Etnografia e Imagem, do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O trabalho é coordenado pelo professor Marco Antônio Gonçalves e está apenas no começo. Cerca de 10 horas de filmagem já foram coletadas pelas pesquisadoras Rosilene Alves de Melo e Fabiene Gama. Um dos pontos visitados foi a Lira Nordestina, que recentemente passou por reformas e planeja reeditar clássicos do cordel.

Uma das pesquisadoras, Rosilene Melo, já vem realizando trabalhos voltados para a cultura regional desde 1994. A Lira Nordestina foi seu foco de pesquisa para mestrado, resgatando a história de um dos grandes referenciais do cordel no Nordeste. Atualmente, o que ela classifica como escola de ofício, está sem confeccionar cordéis há cerca de dois anos. O espaço passou por uma revitalização e ampliação. O velho maquinário está exposto juntamente com as xilogravuras.

Reedição

A idéia dos que fazem a Lira Nordestina, a exemplo dos irmãos Cícero e José Lourenço, é reeditar os livretos, principalmente os clássicos do cordel, como Pavão Misterioso, João Grilo, Canção de Fogo, A Chegada de Lampião no Inferno, Coco Verde e Melancia, dentre outras edições. Esses são trabalhos constantemente procurados. O resgate da história da Lira, intitulado Arcanos do Verso, de Rosilene Melo, recebeu o prêmio Sílvio Romero, do Ministério da Cultura, e o prêmio Raymond Cantel Poitiers, em homenagem ao professor da Universidade de Poitiers, Raymond Cantel, que dedicou sua vida à literatura de cordel, divulgando o universo de cantadores de cordel na França.

Atualmente, a professora faz parte do quadro docente da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), na Paraíba. Mas foi na Universidade Regional do Cariri (Urca), no Ceará, onde começou a desenvolver as atividades. A Lira faz parte de uma das vertentes do seu trabalho, mas a cultura do Cariri inicialmente teve registros de imagens, desde o início do mês, com o reisado, a religiosidade, o Mestre Noza e a Lira. Em junho, será registrado o ritual do pau da bandeira, em Barbalha. “Tudo isso, com o objetivo de levar a uma reflexão sobre a cultura da região do Cariri, seu povo, suas origens”, explica Rosilene, ao esclarecer que a finalidade não é de realizar apenas documentários, mas se deter ao estudos dos registros. O trabalho passará por uma edição rigorosa.

Outro aspecto é dar destaque a elementos que ainda não obtiveram registros na região. A Lira Nordestina, por exemplo, até hoje foi foco de reportagens, mas não existe, segundo a pesquisadora, nenhum filme sobre a gráfica. Ela ainda ressalta a ausência de divulgação junto aos públicos da região e até de Juazeiro. “Grande parte da população sequer sabe que existe a Lira, tão importante para a história da xilogravura e do cordel. Um documento vivo de registro da história do povo nordestino”, diz ela.

São várias gerações de xilógrafos e cordelistas que já passaram pela Lira. Um deles, que em março terá seu centenário comemorado, será Patativa do Assaré. O poeta, que chamam de popular, conhecia de Camões a Castro Alves. Trouxe a Lira para a Tipografia São Francisco. Rosilene, quando iniciou seu trabalho de pesquisa ainda encontrou a Lira na Rua Santa Luzia, no Centro de Juazeiro do Norte. Depois disso, a Lira passou pela prédio da antiga estação ferroviária do município e agora se encontra no Pirajá, num espaço refeito e todo ampliado.

Parceria

Antes de parar a produção artesanal de cordéis, o local estava funcionando por meio, praticamente, do projeto Sesc Cordel. Segundo Cícero Lourenço, eram quatro mil folhetos produzidos. O projeto foi responsável pela reativação da Lira durante alguns anos. No mês de dezembro foi realizado na entidade o Encontro de Graphias. O diretor da entidade, Titus Riedl, destaca que um dos objetivos é dar mais visibilidade à Lira Nordestina, levar os estudantes ao local, para que conheçam a história da gráfica.

Desde 2005, a Lira Nordestina, mesmo que ainda seja do conhecimento de poucas pessoas e pesquisadores, funciona como Ponto de Cultura. Há cerca de dois anos foram reeditados 10 clássicos da literatura de cordel, que em pouco tempo ficaram esgotados. Isso é um sinal de que mercado dessa literatura é o que não falta para os cordelistas.

SEM PROSPERIDADE
Falta incentivo às novas produções


Juazeiro do Norte. Um dos questionamentos da pesquisadora Rosilene Melo diz respeito à produção do cordel na região. Muitos poetas procuram as gráficas para imprimir seus trabalhos. O incentivo aos jovens escritores acontece por meio de projetos como o Sesc Cordel. Mas, até o momento, o processo artesanal, tão cortejado pelos amantes da Lira, continua no sonho dos próprios oficineiros da arte. Ao chegar à Lira Nordestina, vê-se um espaço organizado à espera de um apoio para o desenvolvimento de uma trajetória que parou um pouco no tempo. Para os românticos poetas, a esperança não morre jamais.

E é dessa forma que os xilógrafos e cordelistas que fazem a Lira vislumbram projetos por meio da Secretaria de Cultura do Estado e outras instituições de fomento. Um dos problemas, conforme Cícero Lourenço, está relacionado ao tempo de produção e um maior número de funcionários, se for para adotar o método de montagem dos tipos para impressão dos textos poéticos. “Essa é a graça para os pesquisadores. O que faz a diferença da Lira, sendo o único espaço a adotar esse método de trabalho”, diz.

Mas, por outro lado, o irmão de Cícero, José Lourenço, destaca a ausência de instrumentação, a exemplo das tipologias para o trabalho. Até mesmo em São Paulo, ele afirma que se torna difícil encontrar o material. Seria preciso pelo menos 15 tipos para cada letra. O xilógrafo Francisco Correia Lima (Francorli) diz que são necessários oito funcionários, para realizar a composição dos tipos. Parece inimaginável atender essa condição na produção do cordel para alguns cordelistas.

Surpresa

A doutoranda Rosilene Melo, ao chegar em centros como São Paulo, onde estão cerca de 9 milhões de nordestinos, dentro de uma população de 14 milhões de habitantes, e no Rio de Janeiro, se deparou com uma realidade diferenciada em relação ao cordel. Esteve na Academia Brasileira de Literatura de Cordel (ABLC). Um tratado em constante ebulição.

A surpresa veio com uma demanda. São salas inteiras cheias do livreto para abastecer um público de jovens, nas escolas, e leituras obrigatórias para os vestibulares. No Ceará, pelo menos, a adoção dos livretos de cordel chegam a ser pontuais. O que deveria ser um forte atrativo, um meio para expandir a cultura de forma didática, está ainda muito restrito. A ausência de apoio emperra a abertura de um mercado. Nas décadas de 1950 a 1970, quando não se dava vencimento aos cordéis produzidos pela Lira, o Nordeste inteiro era abastecido e até Estados do Sudeste.

Eram cerca de 10 mil por semana. Faz com que se viva numa letargia profunda em relação a um dos fortes elementos da cultura nordestina. Parece uma contradição encontrar cordéis para vender em São Paulo, enquanto no Cariri, referência nesse tipo de ofício, não há produção. Pelo menos é essa a visão de Rosilene sobre os Arcanos do Verso, na sua atualidade. Ela lamenta uma trajetória vitoriosa da Lira, que infelizmente parou no tempo.

A pesquisadora também destaca a visibilidade da cultura popular do Cariri na região sudeste do Brasil. As butiques adotam imagens como a do Padre Cícero em estampas de roupas. Essa foi uma das situações que chamou sua atenção, sem falar nos trabalhos dos artesãos do Mestre Noza. Para ela, Cariri é uma referência na cultura. O que pode não ser novidade para alguns, mas para a maioria da população, é um tesouro a ser descoberto.

Mais informações:
Lira Nordestina
Rua Castelo Branco, S/N
em frente à Praça do Mateu
Juazeiro do Norte (CE)
(88) 3102.1150
ELIZÂNGELA SANTOS
Repórter

ENQUETE
Tradição será mantida com novas edições?
José Lourenço
Xilógrafo Cordelista

Estamos há quase dois anos desativados. Queremos editar não só os clássicos como os novos livretos

Cícero Lourenço
Xilógrafo e Cordelista

Temos que ter condições para produzir. As pessoas sempre estão à procura. A idéia é reeditar alguns clássicos

Manoel Inácio Gomes
Xiológrafo e Cordelista

Estou na Lira há quatro anos. Aqui comecei a produzir o cordel a e xilo. Sempre procurei ler os clássicos




Fonte: Diário do Nordeste

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